ILUSÕES
Pedro Brasil Junior
 
 
Quando nasci, as ilusões fizeram festa!
Não havia chegado mais um ou qualquer um!
Quem chegava era apenas eu!
E o mundo foi rodando conforme meus passos.
Verdade que antes dos primeiros passos, em tentativa apressada e desastrosa, despenquei por uma escadaria e lá fiquei rindo à toa.
O susto ficou por conta dos outros!
Assim, divertida seria minha vida por conta das ilusões.
Ah! O mundo à minha volta não era necessariamente o mesmo em que as outras pessoas viviam e sofriam.
Meu mundo era algo fantástico, que só eu via e aproveitava.
As ilusões desfocavam a ótica do meu olhar quando qualquer acontecimento trágico surgia ao redor.
Não eram coisas normais da vida, mas ao meu entender, faziam parte do mundo.
Não consigo lembrar hoje de alguma passagem necessariamente tão séria que me faça abrir arquivos da dor, do ódio ou de uma dessas pirraças que a maioria faz questão de carregar nas costas pelo resto da vida.
Não quer dizer que tudo tenha se passado às mil maravilhas afinal, viver tem lá seus infortúnios, seus desgostos e seus malabarismos.
Nada que não tivesse surgido na forma de uma experiência nova, onde a gente ganha dois novos tijolos e vai, aos poucos, erguendo os degraus.
Quando se fala em “memória implacável”, me vem à cabeça não a idéia, mas a certeza de que no mundo lá fora, a maioria das pessoas carregam em seus neurônios um filete onde armazenam suas piores passagens, suas dores e dramas, seus ódios e dissabores e seus amores impossíveis que tatuaram figuras horrendas a respeito das desilusões.
Não sou menos do que os outros! E nem mais...
Sou apenas eu e continuo minha jornada enfatizando as ilusões enquanto a realidade, a exemplo de uma viúva negra, prossegue tecendo sua teia mortal.
Lá se vão cinco décadas desde a minha chegada e me parece que foi ontem. Surpreso eu fico, não pelas cinco décadas ou pela jovialidade que se escoa, mas porque neste longo período de tempo, as ilusões foram sendo expulsas da vida da maioria das pessoas.
Elas querem apenas o real, o momento, o material, o superficial e a oportunidade de tirar vantagens para bem viver.
A ilusão nada mais é do que uma coisa abstrata, que nos permite enxergar o que não existe, viver o que não é real, estar fora do mundo em sua concepção mais apropriada. É o verdadeiro engano dos sentidos e da mente, que proporciona um estado de ser verdadeiramente o que se é, sem máscaras, sem apelos e sem melindragens.
Vivemos um tempo em que às pessoas desejam um mundo mais humano, porquanto a violência alastra-se por todas as ruas.
Vivemos uma época de gente estressada, descontente, mal humorada, de mal com a vida dia após dia.
Tempo em que se faz um belo dia, reclamam que está muito quente. E se chove então...
É pena isso tudo, porque os bons tempos que a memória tratou de selecionar, foram justamente aqueles onde por certo, cada um caminhava em seu deserto na certeza de chegar a um oásis.
E os oásis sempre apareciam, ainda que fosse uma ilusão.
Onde foram parar os oásis, as ilhas desertas, os vôos entre as nuvens ou entre as estrelas?
Ilusões perdidas a cada partida de um dia, no seu entardecer de mil facetas alheias à maioria dos olhares.
Sim! A vida é um grande circo onde o palhaço faz fosquinhas para arrancar gargalhadas, porém ninguém mais ri de piada pronta ou de pequenas ingenuidades.
O palhaço aprende assim a chorar de verdade e vê o circo virar sucata. Porque o mundo já sucateou faz tanto tempo...
E a ilusão deixa o picadeiro em sua vestimenta de seda enquanto sua inimiga, a desilusão, ri à toa pelas esquinas de todas as vidas.
Não me julgue e nem me ache louco. Continuo sendo apenas eu e meus passos, que de tantos já perdi a conta, seguem me levando através do tempo, por entre as ruas movimentadas, com gente empastada e entupindo os shoppings, as sirenes tocando sua música estranha e as vitrines domésticas cuspindo, dia e noite em todas as salas, essa cruel realidade que consome o sossego, incita o consumismo, convence de que certas atitudes são necessárias e engole de uma vez por todas as últimas sementes de honestidade e bom caráter.
E a ilusão fica trocando canais com seu controle remoto para ver se encontra a esperança e quem sabe, juntas, conseguem cantar uma canção que realmente toque o coração dos homens e os façam resgatar o real sentido da vida.
Enquanto isso me permito abrir a janela e ficar observando a ilusão dançar nas nuvens e fazer delas, em frações de segundos, as formas mais estranhas que realmente mexem com a imaginação.
O restante ao redor da vida se traduz nos fatos que cercam todas as pessoas, com suas decepções, seus descasos, suas injustiças, seus ganhos ilícitos, seus poderes hipócritas, seus ideais mascarados e suas falsidades tão cruéis que certamente desfocam a própria imagem diante do espelho.
Mas o que é a vida então?
Simples! – Basta não carregar para sempre o ódio e a inveja.
Melhor cultivar o amor verdadeiro, aprender a perdoar e a pedir perdão e acima de tudo, exercitar a paciência porque afinal, o mundo não pára e essa gente atribulada estará amanhã, cedinho, repetindo minuto apos minuto todas as ações estabelecidas em seus roteiros de vida.
Iluda-se um pouco! Acredite que existe um cavalo com asas e se deixe galopar entre nuvens por uma aventura de sua imaginação.
Acredite que existe um coelho que vive correndo, carregando um relógio e gritando "estou atrasado!".
E você vai descobrir o quando está à frente do seu tempo.
 
 
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