VESTIDO BRANCO
Carla Deboni
 
 

O enlaço das nossas pernas mal me deixa caminhar, e é flutuando que volto para casa. Tenho nos braços ainda os seus cabelos, que há pouco me roçavam o corpo feito a relva num dia de verão. Olho para os lados e nada mais vejo do que corpos estranhos que desconhecem a felicidade interna que me faz sorrir.

Olho para o semáforo antes de cruzar a rua e me divirto com as cores que piscam em questão de minutos. Lembro-me de mim, de você, de nós, no amadurecimento do prazer, do verde, ao amarelo... finalmente vermelho.

Coloco nossa música e relembro as palavras que me disse no auge da entrega, e de repente paro para não gastar muito a memória e deixar um pouco pra depois, para quando estiver só em casa e puder sussurrar às paredes o que outras paredes presenciaram.

Jamais imaginara que tamanho furor me tomaria assim um dia, e que eu, sempre dona de mim e de meus gestos, tremeria à simples imagem sua diante de mim, à simples melodia da sua voz ainda na porta da frente, anunciando sua chegada.

E aqui estou, sempre sua, a mais fiel serva, a mais pronta amante, num misto de idolatria e paixão no suor do vestido branco que me cobre os seios e as pernas.