Alzira,
Estou
me despedindo. Meu amor é tão grande, que não
posso ficar mais sofrendo desse jeito.
Fiz
de tudo pra você me amar, escrevi nossos nomes nas velas
acesas sobre o prato com mel, guardei dentro de uma maçã,
fiz despacho com pai de santo, trabalho na encruzilhada, joguei
flores pra Iemanjá. Tudo isso pra você me querer,
pra você me amar. Até escrevi Alzira num papel dentro
do congelador, depois tirava e colocava na água fervendo,
na esperança de que se você sofresse, voltaria pra
mim.
Mas
que nada, Alzira. Você só fez me desprezar. Nunca
estava pronta pro meu amor. Quando deitava ao meu lado, ficava
com o pensamento em outro lugar. Hoje eu sei onde andava seu pensamento,
e quem era o dono do seu coração. Como fui burro,
como fui cego. Agora entendo o porquê de todo corno ser
manso.
Os
melhores presentes que meu salário podia comprar eu lhe
dava, todos os dias lavava a louça do jantar, deixava de
ver o jogo pra você ver a novela, e nunca reclamei das contas
altas de telefone, onde você falava sem parar. Era com ele,
agora eu sei.
Eu
lhe quis, eu lhe pedi, eu lhe implorei. Alzira, por que? Aceitava
tudo, meu amor. Só pedia para não me trair. Que
cego eu fui. Todos sabiam que você tinha outro, menos eu.
Quantas
vezes, na rua, me sentia sozinho em plena multidão. No
reveillon do ano passado, na Avenida Paulista, lembra? Uma multidão
brincando e eu infeliz, sofrendo, vendo minha amada cantar e sambar.
Você enchia aquele vestido branco, Nunca foi um modelo de
beleza, mas para mim, sempre a mais linda. Acho que aquele tal
sentia atração pelos seus feromônios. É.
Ele nunca lhe amou.
Alzira,
meu amor, estes seus feromônios são o inferno da
minha vida. Lembra daquela noite, na festinha de aniversário
da Vanda? Estava na sala tomando cerveja quente com a turma (eita,
gente pra receber mal) e você na cozinha, repondo os tira-gostos.
Alzira, eu vi. Eu vi, Alzira, com estes olhos, o marido da Vanda
te encoxando na pia. Como vocês puderam? Aquele dia eu já
me senti um desgraçado.
Hoje
eu sei que você nunca me enxergou como homem, você
me tinha para fazer figuração, para pagar suas dívidas,
eu era o tapete pra você pisar, era o chão para você
cuspir, era o banheiro pra você dar a descarga.
Por
que, Alzira? Justo com aquele safado e sem vergonha do Alfredo?
Não
podia ser com outro? Que vergonha, Alzira. Que vergonha. Justo
com o Alfredão? Pensa que eu não fiquei sabendo
que você usava meu dinheiro para comprar presentinhos pra
ele? Pensa? Descobri até que as suas amigas mentiam para
acobertar você. E sabe o que você é para o
Alfredo? Uma aventura, um número a mais na agenda dele.
Ele não lhe ama, Alzira. Nunca lhe amou. Ele só
queria tirar você de mim. Ele quer todas. Todas que tenham
um homem.
Alzira,
até Viagra tomei, para satisfazer você. Nunca precisei,
mas achei que se ficasse teso por mais tempo, apagaria este seu
fogo e você não teria mais ninguém. E você
detestou, Alzira. Riu de mim. E contou praquele homem bonito e
bem apessoado que eu tinha tomado remédio pra ereção.
Justo pra ele, sujeito de fala mansa, a quem muitas mulheres entregaram
o coração e muitas outras coisas mais.
Isso
eu não posso suportar, Alzira. Eu ouvi ele conversando
no bar sobre o tal remédio, e tenho certeza que era de
mim que ele falava. Isso não se faz, Alzira. Por isso,
minha querida, meu amor, quando você ler essa carta, minha
vida estará acabada. Mas não pense que o remorso
de carregar minha morte nos ombros vai ser a sua única
dor. Você vai chorar muito, minha querida. Você vai
sofrer muito ainda. Porque antes de acabar minha vida, acabei
com a vida do Alfredo. Saia, corra, vá depressa conferir
onde está o seu amante, morto, cheio de formigas, vai.
Coitado,
ele não teve culpa, era a natureza dele. Não traiu
ninguém. A culpa foi toda sua, vagabunda!
Alfredo
e eu não lhe daremos paz.
Um
beijo, minha querida. Eu lhe amo, sua puta.
Para
sempre seu,
Armando.
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