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Elaine Grava
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Da mania de tamborilar os dedos suados na escrivaninha, ela tinha saudade. Daquele vaievém de palavras rebuscadas, daquela quase erudição, daquele discurso pseudo-filosófico. Do copo d'água quase sempre pela metade, denunciando que nada nunca estava a contento, de bom tamanho, no ponto exato. Daquele cheiro verde-cânfora que saía dos pés, já que ele usava sprays vários para conter o cheiro fétido, vulgo chulé. Nhé. E aquela mania de se limpar a todo momento. E de cheirar muito bem, limpíssimo, aquela coisa meio lavanda demais, pouco máscula, aquela ausência do cheiro de homem. Ela tinha saudade. E punha um vinil muito antigo na vitrola em manhãs de sábado, coisa absolutamente solitária. E se desarrumava no tapete um pouco sujo, contorcendo o corpo, revirando a mente, digerindo a falta. Não conseguindo. Vomitando-a. Rô Rô cantava tão bonito aquela coisa meio assim 'já pus de lado o tormento ... delirantes formas de amar'. Incensos. Barbitúricos. O cheiro da química que lembrava álcool que lembrava limpo que lembrava ele. Merda. E aquela falta do caralho. É, mesmo fraquinho, mesmo satisfazendo-a vezenquando, com muito estímulo da parte dela. Cheirinho de cânfora depois do amor, já que faziam aquele meia-nove e os pés dele ficavam pertinho das narinas dela. Raspas e restos, aquela coisa meio Cazuza. Blé. Ia até o guarda-roupa e via aquelas camisas impecavelmente estendidas nos cabides de arame. Quase todas brancas. No máximo beges. Bem sem graça, bem água morna, bem tom pastel. Aquele pescoço abotoadíssimo, sem pêlo algum à mostra. Nada nunca à mostra, aliás. Nem chulés, nem cheiro nenhum. Nada. Nada de cheiros, de manifestações efusivas, de riso alto e bom, de choro esganado. Uma coisinha murcha, quase apagada, quase nada. Exatamente isso: um quase nada. A não ser nas palavras, no excesso. Era um tanto prolixo. E só. Um amontoadozinho de palavras. E uma quase erudição. Ele, tão repugnante, ela pensava. Uma coisinha insossa e feia e amorfa. E ela completamente febres, ardendo sua falta. "Bendita seja a mediocridade e a miséria nossa de cada dia". Escreveu numa cartolina vermelha, grudou na porta de entrada e nunca mais saiu do apê. |