DE PERNAS PARA O AR

Adilson Sobrinho

Eu, ou o mundo estamos de pernas para o ar?

Não foi esse o futuro que li nos livros, não são essas as pessoas dos romancistas, não é esse o país que sonhei.

Tudo, definitivamente de pernas para o ar, tudo pelo avesso.

A polícia é quem mete medo, pessoas aparentemente honestas (pelo menos durante as campanhas) corrompendo e deixando-se corromper, religiosos molestando meninos, geleiras milenares que resolveram derreter, um ar que não pode ser classificado como respirável, pessoas que não mais se abraçam, casais que não mais se beijam e homens que, invariavelmente, se matam.

E eu, preso em minha Kitnet, minha soturna caverna, enquanto morcegos barões do tráfico, da corrupção e das falcatruas, andam soltos.

Vejo um mundo de cabeça para baixo, ou estou, como um velho e triste morcego, errado, completamente equivocado e donos da razão são os que vivem na luz.

Não sugo o sangue dos miseráveis, não cravo os dentes nos já cambaleantes assalariados, nem enxergo bem para rir-me do sofrimento alheio.

Morcego sou, morcego bom, "platonizo" minha vida e me ponho em minha gruta a preferir viver no mundo das sombras, e certifico-me de que, quem está na verdade de pernas para o ar, é o mundo real.

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