O termostato
marca vinte e oito graus aproximadamente, o aquecedor permanece ligado,
enquanto a luz fria e branca ilumina o ambiente. Os filtros biológicos
borbulham ao som da bomba de ar. Um único escafandrista permanece estático
no fundo, ao lado do aquecedor e coberto de musgo. As plantas dançam no
movimento da água, que mantém seu PH em 7.0. Para reduzir a acidez use
alcalinizante, e para reduzir a alcalinidade use acidificante. É meio
confuso assim no início, mas no jardim biológico submarino, os habitantes
dançam ao som do jazz.
Os Acarás Bandeiras bailam suas cristas ao som de Charlie Parker. Descendo
ao fundo e subindo em piruetas, movendo-se como uma montanha russa embaixo
d'água. Os Limpa-Fundos preferem o som de Dizzy Gillespie, e manobram
em sincronia sua mais elaborada dança ao redor da enorme parede de vidro.
Sobem e descem juntos bailando sua coreografia estereofônica. Os Neons
espalham-se milimétricamente em formação ao redor das plantas, apenas
um pouco acima das pedras do rio - qualquer rio. Os Plathys, sejam roxos,
claros, pretos, ou Mickey Mouses, reinam absolutos no controle populacional
do aquário. Alguns deles reagem melhor a um acorde de trompete, outros
preferem um saxofone, outros menores ainda, preferem ouvir a cozinha,
deixando os que sobraram ouvindo a percursão. Porém todos concordam que
a alegria esfusiante dos gritos de intervenção do Mingus, no clímax da
música, são simplesmente geniais.
O balé New Tijuana Moods apresenta uma performance extraordinária: Os
Plathys bailam através de seu reinado absoluto nas águas neutras do ambiente
biológico da era de Aquarius. Os Neons iluminam de azul todo o jardim
submerso da Babilônia. Os Acarás Bandeiras piruetam e apostam corridas
sob o céu de águas claras e luz fria. Os Limpa-Fundos são os únicos com
uma coreografia própria em volta da montanha de vidro, que cresce ao a
partir das pedras naturais de um rio qualquer. Nem mesmo o escafandrista
escapa da quebra de monotonia em seu Octopussy's Garden - Beatles já é
demais psicodélico para os peixes. Mente superior domina mente inferior....
Goulpi, Goulpi, Goulpi, Goulpi, Goulpi - morreram todos os Goulps, e nem
puderam ouvir as excentricidades dos Mingus, Parkers, Gilespies, Monks,
Coltranes, Davis, Basies, Hubbards, Gordons, Hancocks e muitos outros
não mencionados afora.
Acontece que com o Jazz, os peixes dançam e pulam como fossem bailarinas
de can-can em New Orleans, ou ginastas contorcionistas em nado sincronizados.
Nem mesmo se importam com a luz acessa do termostato, nem com as borbulhas
do filtro biológico, ou com as intervenções espontâneas da bomba de ar,
ou no perigo que os espreita sob suas cabeças, na lâmpada fria de quarenta
watts, devidamente plugada à eletricidade. Nada parece perturbar o balé
sincronizado dos peixes. A precisão de suas manobras lembram as piruetas
cirúrgicas dos monstros jazzísticos em seus instrumentos, e dizem que
a vida 'dos peixes' imita a arte. ...Ou será a vinda dos peixes...
Seja como for, os peixes dançam sim, mas nunca ao som de Pixies, os peixes
dançam ao som de jazz, tanto faz o interprete, musicista, ou compositor.
O estilo pouco importa, existem tantos diferentes, que dificilmente importariam.
O essenssial é invisível para os olhos 'dos peixes'; são as vibrações
de um jazz agitado que fazem os Limpa-Fundos bailarem desordenadamente
em sincronia, ou as ambientações mais lentas que fazem os Neons e os onipresentes
Plathys circularem o aquário em busca de alguma saída para o suicídio
do lado de fora da era de Aquarius.
O escafandrista continua lá, imóvel e estático, coberto de musgo, preso
às pedras falsas de algum rio qualquer.
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