Tema 029 - NO MEIO DA ALEGRIA
BIOGRAFIA
ATRÁS DO TRIO ELÉTRICO
Bruno Freitas
Imagine-se no meio do carnaval em Salvador, e aquela idéia pingando gota em gota, transbordando de sua cabeça. Aquela idéia fixa, em corredeiras, cachoeiras, água em precipitação, torneiras, chuveiros, caixas d'água, mangueiras, as cataratas do Niagara, e Foz do Iguaçu. Naquele momento, você não existe. Faz parte da multidão, no meio daquela massa compacta e maciça, te levando ladeira abaixo, aproximando suor com suor, esmagando ombro com ombro, e castigando os dedos dos pés. Para logo depois, subir um pouquinho mais, apertando mais um pouco, esmagando mais, e castigando os dedos muito mais. A única solução seria aliviar-se em pé, sobre todo camisu, e pior ainda, no meio da pipoca.

Existe um meio científico e nunca antes estudado profundamente, para separar-se desta massa. Podemos calcular a trajetória do projétil, considerando à massa o valor da gravidade, para obtermos o valor exato a ser atingido. Digamos por exemplo que queiram separar-se da massa, nos próximos dois quilômetros seguintes: Força é igual massa por aceleração. Devem então, aplicar sua velocidade constante de 3 km/s, e observando que a gravidade, a massa, ou a força, e até a aceleração é de 10 x m = força, chegamos a conclusão que nunca conseguirá separar-se da massa, nem mesmo por ordem de uma divisão no núcleo átomo, que poderá causar uma explosão atômica.

Sendo assim, somente com uma grande margem de probabilidade, conseguirão separar-se da massa no exato local que gostariam. Além do mais, ir pra onde, uma vez lá no meio, não existe saída. Render-se nunca, retroceder-se jamais, e você encara a multidão. Além disso, você já encontra-se num estado emocional de invencibilidade e imortalidade. Nas primeiras horas, você está alegre, depois você passa bem no meio da alegria, e vai direto para a euforia, e para a infantilidade. Somente após algumas horas, embebido de cerveja dos pés a cabeça, e emergido à uma histeria coletiva em massa, constatando que a alegria é contagiosa e nem um pouco democrática.

Que culpa tenho eu se todos estão alegres? E eu com minha tristeza onde ficamos? Provavelmente em casa, longe de tanta algazarra, mas acontece que não encontrava-me em condição de prever tamanha muvuca. Foi quando tarde demais, constatei a ditadura da alegria. A alegria alastrou-se como um câncer, invadindo a cidade inteira, transformando-a num caldeirão de folia, fervilhando como uma explosão atômica de energia humana. Tanto fosse na Bahia ou Pernambuco, o importante é que a folia toma conta da cidade, tomando-a por Estado de Sítio de alegria. Taí! A ditadura da alegria.

Talvez por isso, que os desfiles dos blocos são dia sim, e dia não. Um dia de folia e outro de descanso. Como fosse o bastante para foliões afoitos, que mal podem esperar o dia seguinte, e caem na folia do dia seguinte, seguidos de uma rebordosa. Um gosto de guarda chuva aberto, barro, tijolo, a transpiração alcólica, e embebedando-se de suor. Mal sobra tempo para divertir-se com a ralação, a cantoria, o som, as mãos e o tempo das ruas quase sempre estreitas. Mal sobra espaço na cabeça, pra tanta euforia, alegria, e bebedeira juntas.

Um baiano em referência já dizia, que "atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu". Pois está certo, porque somente mesmo morrendo de cansaço, você teria a oportunidade de separar-se daquela massa humana.

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