COMO
EVITAR UM HOMEM NU
|
|
Helô
Barros
|
|
Nunca foi uma questão moral, mas estética. Uma balburdia de potes, cremes e tecidos. A luz do camarim, as caixas de maquiagem, araras lotadas de roupas, mulheres quase em pêlo, espelhos por toda a parte, um tubo de rímel aqui, um roçar de lábios para esfumaçar o batom ali, um... dá pro você emprestar o blush? Claro, querida. Ambiente perfeito para que as mulheres avaliem, descaradamente, suas adversárias. Bons e velhos tempos aqueles, quando eu fazia desfiles pra descolar uma grana. Já sabia que não tinha futuro, mas mesmo assim, eu não ia deixar de aproveitar o fato de ter sido sempre a última na fila do colégio e a infelicidade de ter o apelido de Olívia Palito. Pra alguma coisa aquilo ainda havia de me servir, nem que fosse só pra eu comprar aquela mesa lateral de sofá. Voltando à vaca fria, estávamos lá, as mulheres, naquele alarido nervoso de antes da passarela. Algo precisava nos distinguir que não fossem as medidas e a comparação do peso e das pernas. Poderia ser uma mãe, um amante, uma casa perto do ponto do ônibus, se se gostava ou não de jaca, qualquer coisa seria melhor do que entender que éramos somente um bando de meninas magricelas e tapadinhas, trabalhando pra uma confecção do Pari e mesmo assim se achando... Sabe como é? - Mora com o namorado? - Moro. Há seis meses. - Nossa, que eternidade. - E você - perguntei. - Deus me livre. - Por que? - Não sei como agüenta, ter na sua frente todos os dias, um homem peludo, andando pela casa vestido somente com a cueca e as meias soquetes pretas. Como ela sabia que o meu namorado era peludo e usava cueca de cores variadas e meias pretas? Era tão evidente assim? Ele parado frente à privada errando o alvo, aqueles gambitos arrematados pelas meias pretas, a cueca branca de elástico frouxo, as pernas abertas, o jato de mijo afogando a minha juventude, as bordas do vaso, o piso, a minha sanidade. Capaz dela saber disto também. Que vergonha. Um baque. Foi quando descobri que aquela história de namorado não estava indo lá muito bem das pernas, ou melhor das meias. Pra disfarçar a minha triste realidade perguntei: - E você? Prefere então um homem nu? - Melhor no escuro. - Sei. O tempo de Olívia Palito terminou, mas a impudica imagem de um homem nesta trágica indumentária eu nunca mais esqueci. Aliás, tento evitar. Desde então, considero e reconsidero o escuro, o claro, as vestimentas, a cueca, os pêlos, os dedos e as meias. Quanto ao homem nu, ainda não cheguei à conclusão definitiva, também pra quê? |
|
Protegido
de acordo com a Lei dos Direitos Autorais - Não reproduza o texto
acima sem a expressa autorização do autor
|