Tema 198 - PORTEIRA FECHADA
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AOS PORTÕES DO PALÁCIO
E. Rohde

Às terças-feiras, quando não havia deliberação do conselho, o rei saía do castelo disfarçado de plebeu. Levava sempre consigo uma moringa, porque no deserto era difícil encontrar água fora do palácio, mesmo na cidade.

Cada cidadão tinha direito a uma ração diária de água, que era distribuida pela manhã junto ao muro do palácio. Um dia, durante o seu passeio de terça-feira, o soberano foi abordado por uma mulher. Disse que seu marido estava doente, e que por isso não pode ir buscar a sua ração de água no palácio:

- Visto que o senhor tem boas relações com o palácio, porque lhe deram água fora do horário estabelecido, peço que o senhor interceda por nós para que nos dêem aquilo que é um nosso direito.

O rei, que podia muito bem satisfazer a mulher, achou melhor manter o seu disfarce e respondeu com uma gargalhada:

- Boas relações com o palácio? Quem a senhora pensa que sou? O rei só tem boas relações com a rainha. Tome, beba um pouco desta água que me deram pela manhã e leve outro pouco para o seu marido. Só não me esvazie a moringa, porque é tudo o que eu tenho e tem que durar até o próximo nascer do sol.

A mulher deitou um pouco d'água para a sua moringa, agradeceu e foi embora. Enquanto isso, outras pessoas que passavam e ouviram a conversa foram formando um círculo em torno do rei disfarçado.

- É isso mesmo, o rei só se preocupa com o rei, disse um.

- No palácio, eles têm toda a água que querem, quando querem, e nós que passemos sede, disse outro.

- É uma vergonha, disse o rei sem saber como sair daquela situação.

- Meu filho morreu quando tinha três anos por falta d'água, confessou uma mulher.

- Quando eu nasci, minha mãe adoeceu e, por falta d'água, faleceu, disse alguém.

E todos se perguntavam o que aquele homem teria sofrido para começar aquele debate subversivo no meio da rua. O rei então inventou uma longa história de como tinha perdido toda a sua família e de como era tudo culpa do rei. A medida em que contava mais e mais gente foi se aglomerando e os ânimos foram se exaltando.

No final do relato a massa ensandecida tomou a estrada do palácio e investiu contra os portões até levá-los abaixo. Capturaram a rainha, o primeiro-ministro e todos os conselheiros. Antes da execução, foi o próprio rei a fazer o mais inflamado discurso condenando a monarquia e saudando a república nascente.

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