CAVALO
SONHADOR
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Alice
de Sousa
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Com a porteira aberta ou fechada sempre deixei meu cavalo amarrado, encilhado e de barriga cheia. Mas nem por isso ele deixava de espiar por cima dos meus ombros alguma égua ajeitadinha. Desconfio e quase tenho certeza de que ele ja pulou a cerca algumas vezes. Hoje eu não me importo nem com uma coisa nem com outra se ta preso ainda ou se ja soltou as amarras. Mesmo porque eu ja dei meus coices, me esfreguei na poeira e ja o derrubei da minha cela. Não que eu tenha feito isso por boa vontade, não, na verdade ele me forçou quando quis me botar uma focinheira depois de muitos anos de cavalgadas livres, mesmo em um pasto privado e mantido por ele. Digamos que nossos relinchos não atraiam mais um ao outro e tenhamos perdido muito de nossa potencia com a idade, mesmo assim poderia existir aquela força animalesca e selvagem comum aos animais, porém, acho, que muita ração acaba prejudicando algum desempenho no complicado e implacável passar do tempo. O que acabou ficando foi apenas o vazio de longos pastos sem capim, vastos currais em ruinas, ração mofada. O que o tempo faz o coração sente. E ai fica ate a morte a sensação de que nada foi feito, nem aproveitado. Apenas levamos o resto da vida a lamentar as feridas, ver os pelos ficando brancos, peles descamadas, flacidas e enrugadas. Mas o pior de tudo não morre, são as lembranças, a saudade e a vontade de viver tudo outra vez. Velhos tempos e belos dias! |
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