HORA
MARCADA
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Cris
Dakinis
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Eugênio apressava Luísa, que contrariada com a impaciência do marido, desistiu de trocar de bolsa novamente, a fim de que não se atrasassem. Chegaram cedo ao consultório. Luísa observou que a janela estava escancarada. Subiram uma pequena escada até chegarem a uma larga porta de grades que separava os degraus da sala de espera. Podia-se divisar através das grades a porta do consultório, que se encontrava fechada. Eugênio estranhou. Conferira o número do prédio antes de subirem. "Confundira a data ou hora da consulta?". Luísa reclamava enquanto insistia em apertar uma campainha que descobrira no portal. Eugênio consultou seu caderninho de anotações: dados corretos. Precisavam aguardar... Cansados, sentaram-se na escada, enfim. Como não havia mais ninguém, puderam esticar as pernas ao longo dos degraus, e Luísa até achou divertido assistir à chuva miúda que caía lá fora no pátio de um prédio ao lado. Por falta de melhor distração, passaram a conversar amenidades. Foi então que Eugênio decidiu recostar-se à porta gradeada e esta se abriu. __ Ora! Estava somente encostada! E nós aqui, feito dois bobos sentados do lado de fora! Ainda bem que não chegou ninguém para nos flagrar nessa situação __ Observou Luísa. Entraram. À recepção, porém, não havia ninguém para lhes atender. A porta do consultório estava fechada. Contudo, ambos ouviram uma voz dentro do consultório. Parecia ser a do médico conversando por telefone ou com algum paciente. Ficaram aliviados: o doutor Rômulo já havia chegado e seriam logo atendidos. Sentaram-se, e dessa vez, nas poltronas. Esperaram muito... Luísa mostrava-se mal impressionada com a poeira acumulada: "Nenhuma faxineira? Então o doutor cobrava caro a consulta para aquele desleixo?". Eugênio ouvia as reclamações e cismava... Havia algo errado... "E os outros pacientes?". Sentiram então um forte cheiro de remédio, desses usados para tratamento dentário. A espera estava longa e monótona... Luísa precisou utilizar o lavabo, e Eugênio a acompanhou ao longo do corredor. Ficaram surpresos com o que viram ao abrirem a porta. Estava tudo muito sujo e abandonado. Olharam, quase ao mesmo tempo, para um filtro d'água feito de barro que estava sobre um suporte a um canto. Eugênio destampou o recipiente: a água encontrava-se lodosa. Foi o suficiente para que decidissem, sem trocarem palavra alguma, sair dali imediatamente. Após atravessarem a porta de grade, avistaram uma moça no alto do prédio ao lado, acenando-lhes vigorosamente, como a sinalizar que se fossem. Deram asas aos passos e desceram as escadas com o vigor de um casal de adolescentes. Do lado de fora do sobrado, acharam certa graça do medo que sentiram. __ Eu não volto mais lá! __ Disse Luísa veementemente. Eles se lembraram do barulho dentro do consultório, do cheiro de remédio, da voz lá dentro. Luísa avistou uma banca com vistosos caquis e distraiu-se do incidente. O fruteiro era simpático e falante, então Eugênio resolveu perguntar se ele ouvira falar no doutor Rômulo. __ Claro! __ Conhece-o então? Rapaz, nós estivemos no consultório dele, mas o doutor não apareceu... __ O senhor esteve lá, hoje? __ Sim. Hoje não é dia de consulta? Marquei a consulta pelo telefone. __ Olha, se estamos falando da mesma pessoa __ e acho que estamos __, ele não poderia mesmo estar lá, não. O doutor morreu há mais ou menos um ano. O consultório ficou fechado desde então. Quando foi que o senhor marcou essa consulta? Eugênio ficou perplexo e Luísa parecia uma estátua, de paralisada que ficara. __ Rapaz, eu falei com ele nessa semana pelo telefone. Ele mesmo atendeu ao chamado e marcou o horário comigo __ Insistiu Eugênio. __ Ah, ah! O senhor levou uma "pernada" de algum gozador! Vai ver, o senhor ligou para um número errado... Não há ninguém trabalhando naquele sobrado. Ninguém nem sobe lá pra nada! __ Amigo, falei com ele. Reconheci-lhe a voz. E tem mais: ouvimos pessoas falando dentro da sala dele hoje, e estavam usando os medicamentos do consultório, sentimos o cheiro... O fruteiro ria a valer, mas reparando o rosto de seriedade do casal, recompôs-se. Não podia deixar de lhes dizer, entretanto, que ninguém usava aquele sobrado desde a morte do doutor. Após pagar o estacionamento, Eugênio decidiu, para contrariedade de Luísa, perguntar ao vigilante do pátio se ele conhecia o dentista. __ Sim, conheci. Faleceu há um ano. O senhor veio procurar por ele? Tem outro dentista também muito bom aqui pertinho. Nem precisa ir de carro até lá... Eugênio e Luísa preferiram seguir para casa. Enquanto abriam a porta, o telefone tocava... __ Que foi? Que cara é essa? Quem era ao telefone? Alguém morreu? __ Indagou Luísa. __ Pelo contrário... Era o doutor Rômulo para remarcar a consulta... |
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