DENGOS
E AGRADOS
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Tieme
Mise
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A cocada brilhando escandalosamente no tabuleiro parecia pintada de verniz. O cheiro do tamarindo maduro exalando no doce marrom, contendo caroços brilhantes como azeviche, convidava. Abarás em sua capa de palha e acarajés com a casca crocante se misturavam ao cheiro gostoso dos camarões avermelhados. O vatapá cremoso e o caruru fumegante, em potinhos de barro, se exibiam, com o molho avermelhado de pimenta malagueta exalando seu aroma quente e picante. No
seu vestido imaculadamente branco e rendado, Sofia sorria sem nenhum acanhamento
pela falha gritante do segundo incisivo lateral esquecendo que já
não o tinha desde que fora quebrado quando tentara arrancar um
coco de sua casca três anos atrás. Teve que extraí-lo.
Os outros dentes mantinham, como um cercado branco, a língua vermelha
e precisa. O sulista vermelho com o calor baiano, parado ao lado do tabuleiro, mostrava na expressão o espanto pela cor de ébano, negra e ainda viçosa, da velha senhora ornamentada com colares e pulseiras de todos os Orixás de seu agrado. Comprou dois acarajés do tabuleiro e seis cocadas brancas admirado com o brilho delas. Pagou, falando à baiana para ficar com o pequeno troco que restara. Sofia sorria com a simpatia do homem branco do sul e retirando de uma vermelha vasilha de plástico um pequeno copinho de café, cheio de doce de coco moreno, oferece dizendo: - Um dengo para o moço bonito pelo agrado da compra. Num momento único de magia ímpar, a ternura se espalhou pelo rosto daquele jovem homem do sul e daquela velha senhora baiana. Tão distantes e desconhecidos, esses dois seres eram unidos por uma sabedoria inexplicável como se já tivessem interagido muito antes mesmo até de apenas ser. O homem continuou o seu passeio. A baiana voltou aos seus afazeres. Não mais se encontrariam nesta vida, porém esse momento inesperado nenhum dos dois esqueceria. |
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