AR
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Denis
Sevlac
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As
duas primeiras gavetas da cômoda derrubadas ao chão, seus
conteúdos espalhados pelo quarto. Escavando a terceira gaveta,
Reginaldo tenta encher os pulmões de ar. Sem muito sucesso. Todos os cantos do pequeno apartamento já foram vasculhados. Banheiro, cozinha, sala e, agora, o quarto. Nada! Nem vestígios da bombinha que o tira da crise de asma. O sangue pulsando em suas têmporas, bumbos de uma escola de samba imaginaria, levam o pouco de oxigênio que os pulmões captaram na última aspiração. Suas mãos já não obedecem. Os joelhos acham o chão. Com
enorme esforço, deita-se de lado no chão coberto de objetos.
Vira-se, costas sobre o piso frio. O olhar perdido em um teto pulsante
em claro e escuro. Precisa. De. Mais. Ar. Ele sabe que precisa se acalmar. Lembra-se de sua mãe lhe dizendo que com calma a crise passa. Uma mão em sua face, com toque leve e quente. A outra mão em seu peito, acompanhando o movimento do tórax. Um pouco mais de ar é absorvido pelos pulmões. Mais um pouco. As lembranças de sua mãe são antigas, mas sempre ajudam em momentos de desespero. A imagem materna vai dando lugar à de Ágata, sua mulher. Ela sabe que as crises vêm piorando, que ele anda muito estressado. Deixou as fotos da festinha particular que fez com o amante sobra a mesa. Sumiu com as bombinhas. A imagem dela, arfando de raiva ao ver que ele ainda está vivo, aos berros de "você não serve nem pra morrer, desgraçado!", o diverte. Reginaldo continua a olhar para o teto. Sorri. A frieza de suas intenções lhe traz calma. Vai matá-la. Ela e o maldito amante. Mas não agora. Agora ele só quer um pouco mais de ar. |
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