Zé Grande era o cambista (assim eram chamados os anotadores do jogo de bicho) mais conhecido da Cidade. Além do talão do jogo, andava com um dicionário debaixo do braço.

- Onde já se viu cambista com um dicionário...

- Os "Nova Seitas" num andam cuma Bíblia? Apois eu ando cum dicionário.

- Mas... Me diga: Pra que serve?

- Ara, ôme, serve pra sentá, pra jogá na cabeça de perguntadô... Pra socá no...

- Êpa! Olha lá... Tme gente de menor.

- É. Toda hora eu tenho que explicá pra que isso, pra que aquilo. Já tô ficano de saco cheio.

- É isso aí, Zé, liga não(falou o Seu Nivaldo que chegava para jogar), anota aí: Vinte na vaca e dez na cobra. Sonhei ontem com minha sogra.

- Nesse caso até eu vou fazer uma fezinha.

- Isso mesmo. Podem apostar que não falha!

Além do próprio Zé Grande, ainda jogaram na vaca o Pitoco e o Ferro Véio. Para esses dois podia faltar comida, mas não deixavam de jogar no bicho.

- Bebê mermo, nós num bebe. Mas fazer a fezinha, essa não, a gente num faia.

Nisso chegou o Hermínio, mais conhecido como Carrapato.

- Como tão as coisas, Zé?

- Tá tudo bem, Carrapato.

- Qual será o bicho de hoje?

- Mas como vô sabê... Se subesse eu mermo jogava. Qué que você tá quereno?

- Tô mermo é fazendo uma sondagem com você, num sabe?

- Fazendo o quê mermo?

- Sondagem. Pelo visto num sabe o que é...

- Num sei, mas o pai dos burro tá aqui comigo. Espera só um poquinho...

Pegou o dicionário e procurou a palavra.

- Sondage... Sondage... Tá aqui: Sondagem - Ato de sondar... Introdução de sonda na cavidade orgânica... (Levantou a cabeça, olhou bem para o Carrapato e disparou) Tá veno porque ando com o dicionário... Pois você vai introduzir... Vai fazer sondagem... Na... Entendeu?

Olhou para as pessoas que estavam perto, fecho o livro, pegou o talão, olhou outra vez para o Carrapato e vaticinou:

- Por hoje chega. A banca tá fechada.