Atualização 185 - Tema Livre
BIOGRAFIA
TAPETÃO FURADO
Doca Ramos Mello

Diário, vou lhe contar...

Hiii, a vaca foi p'ro brejo!

Eu nem estava sabendo de nada porque o Vantuil tem o costume besta de esconder algumas coisas de mim e só depois do resultado é que vem com a cara lavada me contar isso, aquilo, etc. Quando ele inventou o tal mastro de sei lá quantos metros de altura para colocar no pátio da Câmara com a bandeira do Brasil, eu só fiquei sabendo mesmo porque escutei no rádio. E o inútil do Jorge Microfone, que faz o programa Olá, Perdões só para meter o pau nos políticos, começou dizendo que o tal mastro tinha custado uma baba e que todo mundo sabia para onde ia grande parte desse dinheiro, blá, blá, blá...

Quando perguntei p'ro Van o que era aquele negócio de mastro com bandeira, ele deu uma gargalhada que encheu o quarteirão. "Aquilo é a perua Audi que eu comprei p'ra você, quá, quá, quá!" Então eu fui à garagem e a perua estava lá, lindona, adorei.

Bom, mas dessa vez eu ganhei foi o que Luzia ganhou atrás da horta, isso, sim.

Porque nem o Van mesmo ganhou foi nada, aconteceu que perdeu de vez, perdeu completo, perdeu, playboy, como diz o Vanzinho.

Ontem ele me ligou contando que nunca na vida dele ia aceitar a derrota, muito menos a vitória do velho Rodrigues, eleito prefeito, o Van tem um nojo muito grande do Rodrigues, chega a ser ódio mesmo. Bom, o Van não gosta de quase ninguém, se há uma coisa que ele tem pouca é estima pelos outros, eu mesma, digo sinceramente, aturo muita coisa dele porque nem sou besta de falar que verde não é roxo, porque se ele diz que verde é roxo, o negócio é bater cabeça, concordar sem fazer barulho. Por isso mesmo que eu tratei de arrumar o Rogê, mal ou bem, de um cafuné todo mundo gosta...

Sabe o que o Van fez? Entrou com um tal de recurso para tirar a eleição do Rodrigues na marra, gastou uma grana preta p'ra tentar melar o homem, mas deu com os burros n'água. Isso quer dizer que acabou-se o que era doce. Na verdade, já não era doce desde a hora em que mais de 70% do povo votou no outro, mas o Van não quis acreditar, tudo aquilo que dá errado p'ra ele é merda, ele não aceita. A culpa disso, eu já comentei com você, é do povo, gentinha falsa e maldita que a gente nunca sabe em quem vai votar de verdade, eles mentem, diário, fingem que estão com um e estão com outro, o povo não presta. Eu lhe digo que teve até eleitor que botou o retrato do Van no carro, na frente da casa, na PQP, arreganhava os dentes p'ra nós, batia no ombro da gente, e foi lá na urna e votou no Rodrigues, olha que cambada de ordinário!

E agora?

Bom, agora é isso: nós na vida de todo dia e Rodrigues mais a sonsa da Gaidinha sem sal nem gordura, mulher dele, brilhando no céu da prefeitura, que ódio, que ódio! Olhe que eu suportei o mau humor do Van, a estupidez dele, aquela arrogância - você sabia que ele sempre me chamou de burra? -, agüentei firme, de olho na minha cadeira de primeira-dama, um esforço que vou lhe contar, danado. P'ra tudo se acabar na quarta-feira, digo, no domingo da eleição, o Rodrigues e a Gaidinha nos braços do povo e eu aplacando a crise, o ataque de nervos, o chilique insuportável do Van, que quase me destrói a casa inteira, o bairro, o mundo. Você pensa que foi fácil? Só eu sei o que foi ver aquele homem enorme, a careca suada e os olhos esbugalhados querendo saltar da cara, a baba verde escorrendo pelos cantos da boca - e essa baba é um dos sinais de que ele vai explodir -, ele galopando casa afora aos berros de "malditos, malditos, eu pego essa raça, gentinha de merda, putada inútil", etc.

Só Jesus!

Aí, me encheu o saco e eu vim a Paris, de onde estou achando que não vou voltar antes de um bom tempo, quero ficar longe da ira dele, apesar de estar também, ai de mim, longe do meu Rogê... Se bem que o Van anda dizendo que a lagoa secou, de repente nem dá mais para sustentar essa vida do nosso Vanzinho aqui em Paris, apesar de ainda ter muito peixe nessa água, peixe que ele juntou na vereança, mas eu não entendo isso tudo... Tem lagoa na Câmara?

Acho que o Van vai ter uma síncope, eu conheço bem os ataques de ódio que ele tem. Uma vez, a gente foi a um churrasco enquanto rolava um jogo de futebol e o time dele perdeu. Criatura, por pouco ele não meteu a mão de Aristânio Borba no braseiro, por conta de Aristânio ter falado em "goleada monumental". O Van fez um escarcéu tão grande que foi preciso a gente sair ainda sem que eu tivesse comido uma única colher de farofa que fosse, veja você, e até hoje meu marido não pode ouvir falar naquele cara, amigo antigo, colega de escola até. E olhe que Aristânio escapou de boa porque se o Van tivesse sido eleito, ia desapropriar o armazém dele, me entende? Mas, que eu saiba, na época ele mandou uns sujeitos darem uma sova no pobre, quando Aristânio ia visitar a sogra em Santo Antônio. Quebraram o braço do infeliz - o Van tem seus métodos.

Rodrigues que tome tento ou ainda amanhece por aí olhando p'ro céu sem mexer os olhos, os pés bem juntinhos numa festa de formigas, meu marido não admite derrota, ainda mais se for mexer no bolso dele... Eu até ia gostar porque segundo me contou o Van, se acontecesse de Rodrigues perder o processo, ia ter outra eleição em Perdões e então eu só queria ver se dessa vez meu marido ganhava ou não ganhava - o Van tem seus métodos, já não disse eu?

** P.S.: Saudades do Rogê, saudades, saudades... Mas, devo dizer que esse jeitão fera enjaulada do Van me dá uns arrepios, hehehehe...

Ah, não me condene, a carne é fraca, querido!

Beijo francês da sua eterna primeira-dama (eu chego lá!),

Gecycleide

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