Atualização 184 - Minicontos de natal
BIOGRAFIA
CONTOS DE NATAL - O NOVO VELHO
Mairy Sarmanho

VOVÔ ME SEGUE COM OS OLHOS ENQUANTO ARRUMO SEU QUARTO. ESSE ANO NÃO TEREMOS PAPAI NOEL, POIS A DOENÇA ROUBOU-LHE OS MOVIMENTOS E NINGUÉM SE ATRAVE A TOMAR O LUGAR DO VOVÔ. PAPAI NOEL SEMPRE FOI ELE, COM SUA BARBA BRANCA ORIGINAL, SUA RISADA COR-DE-ROSA, SEUS OLHOS BRILHANTES E O ENORME SACO CHEIO DE BRINQUEDOS QUE COSTUMAVA ABRIR AO LADO DA ÁRVORE.
MINHA VÓ CONVIDOU QUEM PODE: TIO PEDRO, TIO MARCELO, TIO BETO, ATÉ O VIZINHO PAULO ELA CONVIDOU. TODOS REJEITARAM O CONVITE. É A VONTADE DELE, AFIRMOU. COMO ELE NÃO CONSEGUE FALAR, NINGUÉM ACREDITA.
O DIEGO DISSE QUE NUNCA MAIS VAI TER NATAL, MEU PAI EXPLICOU QUE O NATAL CONTINUA, SÓ O PAPAI NOEL É QUE NÃO VAI APARECER. NÃO ADIANTARAM AS LÁGRIMAS DO PEQUENO, NINGUÉM SE CANDIDATOU A SER PAPAI NOEL.
ARRUMEI O QUARTO, PENTEEI SEUS CABELOS E DEI-LHE UM BEIJO DE BOA-NOITE. VOVÓ AGRADECEU E DISSE QUE EU ERA UMA NETA MARAVILHOSA. NÃO ACREDITO, UMA VEZ ROUBEI DOIS REAIS DA SUA CARTEIRA PARA COMPRAR PICOLÉ MAS ATÉ HOJE NÃO TIVE CORAGEM DE CONTAR. ACHO QUE É DAQUELES SEGREDOS QUE LEVAMOS PARA O TÚMULO COMO O VOVÔ COSTUMAVA DIZER.
A HORA DA CEIA VEIO TRISTE. MEUS TIOS E TIAS FINGIAM QUE NÃO QUERIAM CHORAR, MAS EU PERCEBI. MEUS PAIS E MEUS IRMÃOS FINGIAM NÃO SENTIR A AUSÊNCIA DO VELHINHO DE SEMPRE, MAS EU SENTI E NÃO CONSEGUI FINGIR. COMECEI A CHORAR ME ESCONDENDO NUM CANTO.
QUANDO A MEIA-NOITE TOCOU, MEU PAI ERGUEU-SE PARA BUSCAR O SACO DE PRESENTES E QUASE DESMAIOU DE SUSTO QUANDO UM PAPAI NOEL ENTROU NA SALA SORRIDENTE, ARRASTANDO CONSIGO O SACO VERMELHO CHEIO DE BRINQUEDOS.
OS ADULTOS SE OLHARAM MAS NINGUÉM PERGUNTOU QUEM ERA, ALIVIADOS ESTAVAM PORQUE TUDO PARECIA IGUAL COMO SEMPRE.
VOVÓ RECEBEU UM COLAR DE PÉROLAS DAS MÃOS DO PAPAI NOEL FESTEIRO E AGRADECEU COM UM SORRISO CURIOSO. MAMÃE RECEBEU UM BRINCO DE DIAMANTES, MEU PAI UM PRENDEDOR DE GRAVATAS DE OURO E, COMO MÁGICA, PRESENTES CAROS E QUASE IMPOSSÍVEIS SAÍRAM DAQUELE SACO QUASE SEM FIM PARA SURPREENDER E ALEGRAR TODA A FAMÍLIA. NO FINAL, ELE TIROU UM PACOTE PEQUENO E ME ENTREGOU, DIZENDO:
- ESSE É DO SEU AVÔ, ENTREGUE PARA ELE.
PEGUEI O PACOTE COM A MÃO ESQUERDA ENQUANTO ABRAÇAVA COM A DIREITA A BONECA FALANTE QUE NUNCA OUSEI PEDIR PORQUE ERA CARA DEMAIS...
ELE CUMPRIMENTOU TODOS E SAIU, TIMIDO E DISCRETO, PELA PORTA DOS FUNDOS DA CASA.
QUANDO DESAPARECEU A PERGUNTA SURGIU GIGANTE NA SALA:
- AFINAL, QUEM ERA?
- VOCÊS EXAGERARAM NO PRESENTE, MURMUROU VOVÓ. CUSTA CARO DEMAIS UM COLAR DE PÉROLAS... QUEM COMPROU?
SILÊNCIO. NINGUÉM SE MANIFESTOU.
- E OS BRINCOS MARAVILHOSOS DE DIAMANTES QUE GANHEI? - ECOOU MAMÃE.
NOVAMENTE, SILÊNCIO.
UM POR UM PERGUNTOU A ORIGEM DE SEU PRESENTE ENQUANTO CAMINHEI ATÉ O QUARTO DE MEU AVÔ. PARECIA ADORMECIDO MAS SEU CORPO ESTAVA IMÓVEL. AINDA MORNO, MAS IMÓVEL.
COMPREENDI A MORTE POIS MINHA CACHORRINHA TINHA MORRIDO HAVIA UM MÊS. SENTEI-ME AO SEU LADO E, CHORANDO, RELATEI A SURPRESA DE UM PAPAI NOEL GENEROSO E DESCONHECIDO QUE HAVIA ENTRADO EM NOSSA FESTA, ENQUANTO ABRIA O PRESENTE DE MEU VELHINHO AMADO.
EMBRULHADO, CUIDADOSAMENTE, LHE ENTREGUEI UM RELÓGIO SEM PONTEIROS.
ESSE FOI O ÚLTIMO NATAL DE MINHA INFÂNCIA.

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