Na estrada da colina, José foi alcançado por Belchior e Baltazar. Como o caminho era estreito, Belchior pediu licença:

- Levo ouro para o Rei dos Judeus, que acaba de nascer.

Baltazar completou:

- Eu levo mirra.

José falou:

- Quê?

Baltazar pôs a mão no seu ombro e apontou para o alto:

- Vê? É a estrela guia. Vem conosco.

José foi.

Seguiram em silêncio, em fila indiana, até a curva que vai dar no vilarejo, onde José viu primeiro o que não devia, pois a prerrogativa do traído é ser o último a saber. Lá estava, numa manjedoura, a sua amada Maria na companhia de um homem e, para não faltarem provas, o fruto recém-nascido do seu pecado. José foi tomado da cólera. Correndo, gritava:

- Maria, que fizeste?

Maria ainda tentou se explicar, dizer que não era nada do que ele estava pensando. Contou do Anjo Gabriel, da concepção imaculada. Jurou que Gaspar tinha acabado de chegar.

- Eu só vim trazer incenso - ofereceu o garanhão.

José não ia engolir aquela história:

- Que presepada é essa, Maria? Então eu me ausento por uns dias e, quando volto, já fizeste filho com outro?

Aproveitando-se de que a ira de José se concentrava em Maria, Gaspar saiu de fininho, antes que sobrasse para ele. Do lado de fora, reconheceu Belchior e Baltazar. Lembrou-se ter vindo com eles em anos anteriores. Enquanto isso, o pau comia solto lá dentro.

Os reis magos confabularam por um momento e logo veio o estalo:

- Mas é claro! Quando os meninos montaram o presépio, me colocaram por engano no lugar de São José. Vamos lá dentro esclarecer isso.

Mais tarde, com José mais calmo, ficou combinado assim: cada um voltaria ao seu lugar de direito: os três magos atrás da colina, José com Maria e o menino Jesus na manjedoura. A vaca de louça partida iria lá para o fundo, a perna quebrada do berço se cobriria com uma palhinha e Maria ficaria meio de costas para ocultar o nariz lascado. Bastava que fossem rápidos e ninguém perceberia nada.