Todo
dia ela vinha me atentá tava no meu canto sem dá
a menor pelota, mas quem resiste? Arrumava cada futrica, fiquei
zonzo só pra entendê seu vocabularo, sabia das letras
da academia e da vida vadia. Num havia assunto que ela num versejasse,
se o tempo tava ruim. O céu de brigadeiro virava um céu
de candeeiro, pronto pra alumiá minha cabeça confusa.
A diaba estava vestida de encarnado, com uma minúscula calcinha
de maçã capaz de botá o mundo todo pra pecá.
Tinha um sorriso provocante com trinta elefantes de marfim na boca, dentes
prontos pra me matá só de olhá. Parti
pra cima mas a danada refugô. Ah como ela sabia roubá
as palavras de alguém, fazia com a maió maestria.
Tinha que dá a mão a parmatória e batê
naquela bunda bonita. A bicha era tinhosa, sabia quiromancia e
metereologia. Uma cigana de argola na orelha e vestido colorido. Todo
dia era tempo bom pra namorá, não tinha chuva ou
longa distância. Ela tava me esperando. Mesmo que eu desse a vorta
ao mundo - da Espanha ou da Artimanha, ela sabia me pegá.
E por si só criou a "lei do tesão arreganhado"
que num respeitava credo, tratado, cartório ou contraditório,
atracô comigo só para perturbá, aquele
cheiro no cangoti me deixou ensandecido.
Cheguei a dá uns chega para lá, chamava de
Mané e falava alto, vê se arreda o pé. Mas nada, quanto
mais eu retraia mas ela me queria. Fui pegando gosto naquela "danadinha"
passei a observá cada passo, cada letra, cada verso torto.
Ela era um baralho de confusão, falava tudo muito rápido.
Imagina uma convulsão de frases andando na contramão da
escrita convencional. E quem falou que ela se importava com isso. - Dificuldade
é um poço de comodidade pra quem não quer tomar atitude,
disse ela categórica. No segundo seguinte foi ainda mais melodramática
querendo me chamá a atenção com suas "besteirinhas".
A frase saiu como um arroto, de vez: Arreda chão que eu quero passar
com minhas letras desfilando. Vô te mostrá
com quantas letras se escreve um dobrado e com quantas pernas se dança
um xaxado. Tive que enguli porque ela era bonita, não dessas
belezas que há por aí. Ela me lembrava um pedaço
de rapadura com muita cachaça de cabeça das boa,
tamanha gostosura. Uma beleza tosca, daquelas que lapidando ia brilhá
mais que um cristal. Era uma mulher transparente, falava o que dava na
telha, mostrava seu corpo e sua ingenuidade cheia de malícia. Nunca
conheci ninguém assim tão natural, me deixava mais louco
do que só ficar vendo corpo escultural de mulher dessas que passam
na rua. Fui construindo uma imagem especial dela no fundo da minha retina,
de admiração e desejo. Nada mais importava, demorei pra
descobrir o que ela realmente queria, se era apenas uns elogios da suas
"escrituras diabruras" ou se era uns amassos mais apertados
que nó de marinheiro.
Fui atrás dela como um bicho vai, pelo cheiro, quando a vi a poucos
metros de distância. Foi um Deus nos acuda, não que eu seja
religioso mas é que num tem santo nem vela que me faça escapar
dessa mazela. Fiquei completamente téso, afins, a palavra
certa é "léso". De uma leseira que me levava para
o reino das pernas encantadas. Fui catando aquela coxa grossa, beijando
aquela boca rosa. Aquela calcinha vremeia, valei-me meu santo!
Agora entendo Adão e a maçã, fui pará
no paraíso. Só falava isso: Quero entrá...
quero pecá.... abre as pernas minha fia... Ela me faz rir
como ninguém, falô no meu ouvido bem baixinho. Me
chama de "mané" vai vai vai... Fui falando "manezinha"
bem no ouvido e ela confessô com voz de abelha no mel, eu
gozo assim. Agora imagine a encrenca, eu tamanho homem fui reduzido a
pó de areia, desmanchei inteiro, fui me entregando. A futrica da
mané era a forma de amô mais mió desse
mundo. Gozei mais alto que chafariz de praça, foi a lembrança
mais pura que tive nos úrtimos tempos. Aquelas besteirinhas,
aquelas palavrinhas, aquela xaninha, nada podia me deter. Socorro chamem
o exército, os bombeiros, tô pegando fogo de tesão.
Nem a puliça, nem aquele aro no meu dedo vai me prendê.
Puxei pelo pensamento e não bate um arrependimento. Fui em frente,
desembestei a gostá dessa mulé. Foi um amô
de tremê chão e palpitá coração.
Ela sumiu na caatinga, falô que nunca existiu que era tudo mandinga.
Será que foi sonho de jacaré? Tava com o olho aberto e o
bicho em pé feito mandacaru no pé. Sacomé!
Fiquei matutando, será que comi a mané ou foi mentira do
João Tomé?
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