Tema 181 - Farrapo Humano
BIOGRAFIA
DOR DA ALMA
Eva Ibrahim
 

Os automóveis cheios de convidados chegavam e estacionavam em frente á Igreja. As famílias bem vestidas desciam e entravam; a noiva deveria chegar logo. O noivo aguardava ansiosamente em meio aos padrinhos. Havia muitas flores distribuídas no altar e nos bancos. A moça sentada em frente ao órgão esperava um sinal para iniciar a música, que acompanharia a entrada da noiva. O coro estava a postos para iniciar o cântico tradicional. A alegria estava no ar, era dia de festa.

Do lado de fora, longe dos olhos das pessoas um homem se esgueirava para ver a noiva chegar, era Seu Manoel, o pai dela. Um homem sofrido, acabado, doente que queria ver a filha vestida de noiva. Seu coração batia forte, fazia anos que abandonara a mulher e os dois filhos para viver a vida que queria, isto é, bebidas e mulheres. Quando o dinheiro acabou, as mulheres se afastaram, ficando com a bebida e sozinho. A esposa, com muita luta, conseguira criar os filhos e agora adultos seguiam seu caminho.

Soube do casamento por um amigo e não resistiu, queria abraçar a filha, na verdade queria sua família de volta. Sabia que não precisavam dele para nada, estavam muito bem agora e ele um farrapo humano. A vida lhe cobrava todos os desatinos cometidos. Vivia em dois cômodos no fundo de um quintal e a solidão era sua companheira; tinha vergonha de procurar os filhos e a mulher, a quem tinha feito sofrer muito.
O carro da noiva chegou, ele esticou o pescoço para vê-la e com ela estava o irmão, com quem entraria na Igreja, fazendo a vez do pai. Duas lágrimas correram pelo seu rosto, se arrependimento matasse ele cairia morto ali mesmo.

A música começou a tocar e a moça de braços dados com o irmão entrou na Igreja. Seu Manoel devagar se aproximou da entrada, queria espiar o casamento de sua filha, iria rever a mulher com quem um dia se casara. Ninguém percebeu sua presença, todos olhavam a frente e ele pode, por alguns minutos, observar sua família. Como sua mulher estava bonita! A idade não ofuscara sua beleza, continuava com seu porte majestoso, que tanto o encantara na juventude. Olhou para si e sentiu pena, era o oposto dela, se transformara em um molambo, sem eira nem beira. Não podia se apresentar e estragar o casamento, era melhor ir embora.

Saiu e ficou distante, queria vê-los quando fossem á festa no Salão Paroquial, ao lado da Igreja. Ficou atrás de um automóvel com os olhos fixos na saída Os convidados depois de cumprimentar os noivos se dirigiam á festa á espera dos recém casados. Seu Manoel extasiado observava sua família, estavam muito bonitos. Queria abraçá-los e beija-los; Isto era loucura, seria enxotado, era o que merecia, colhia o que plantou.
A música era alta, havia dança lá dentro e muita alegria, lá fora o homem chorava. Imaginava os comes e bebes e seu estômago roncava de fome, não tinha nada em casa, só aguardente.

Depois de algum tempo ele viu sua mulher sair de braços dados com um homem. Foram pegar alguma coisa em um carro e retornaram rindo alto. Foi o golpe de misericórdia a ele só restava morrer; Depois de tanto tempo era de esperar que ela tivesse outra pessoa, mas lá no fundo ele acreditava que ainda estava á sua espera. Não continha as lágrimas, a realidade estava ali e ele não podia fazer nada. A festa não tinha hora para acabar; o homem resolveu ir para casa.
Entrou naquele lugar sujo e bagunçado se sentindo o pior dos homens e a primeira coisa que fez foi pegar a garrafa de aguardente e tomar um grande gole; Bebeu com gosto, para espantar a fome, depois deitou na cama com o cigarro aceso na mão.
Adormeceu e não sentiu quando o cigarro caiu no colchão iniciando um incêndio no local. Os vizinhos chamavam, gritavam e ele não respondia, quando conseguiram arrombar a porta o homem estava desmaiado. Foi levado ao Hospital, mas depois de algumas horas veio a falecer; estava muito fraco e não resistiu a fumaça que inalou.

No dia seguinte uma notícia no tele jornal chamou a atenção da mulher, o nome lhe era conhecido, era seu ex-marido. Foi á delegacia, precisava saber se era ele. Muito emocionada a mulher disse que não sabia se estava vivo ou morto; a muito não tinha notícias e com lágrimas nos olhos ela lamentou:
- "Que pena, não soube do casamento da filha, que queria muito vê-lo"....................

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