BRILHANTE
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Denis
Sevlac
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Rafael viu a pequena menina no ponto de ônibus, costas nuas pontilhadas de cima a baixo pela coluna aparente, dada a extrema magreza. Não fosse a postura inconfundível, não a reconheceria. A imensa franja cortada há alguns dias escondia o rosto contorcido de dor, não física, mas emocional. Ela desaprendera a amar e, principalmente, a ser amada. Envolvera-se com homens que em nada acrescentaram a sua vida. Bons amigos, mas confusos em suas relações amorosas. Pensando isso, Rafael sentiu uma ponta de amargura. Também fora um desses romances tortos, de uma noite apenas. À época, também estava confuso em sua situação emocional, que, aliás, ainda não estava resolvida. Noite formidável. Lembrou-se que, quando a viu, sentiu um clique dentro de si, como algo ligando, duas vezes, as duas em que se esbarraram pela noite. Ficou, depois, querendo reencontra-lá. Saiu do bar onde estava, foi para outro terminar de afogar as mágoas. Conspiração do universo, lá estava ela. Chamou-a para sentar-se junto a si, afinal ela sempre fora boa companhia. Conversaram, encontraram afinidades, coisa nada difícil dada a paixão de ambos pelas artes. Andando lado a lado, o álcool consumido transformando o andar em passos confortavelmente tortos, abraçaram-se. Abraço que transformou-se em beijo. Apesar de conjecturas por parte de ambos, nada mais aconteceu. Levou-a até a porta de casa e despediu-se. Um último beijo, selando a noite como cera em carta inviolável. O ônibus dela chegou. Despediu-se, cabisbaixa, com um aceno desanimado. Foi embora, aquela menina, opaca, mesmo que ainda bela, diferente da luminosa fada de outra noite. Rafael desejou, dentro de si, vê-la brilhando novamente. |
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