SOBRE DESTINOS E CACTOS
Beto Muniz
 
 

Definitivamente eu acredito em destino. Creio que ele, mesmo sem querer, é quem marca nossos encontros exatos. É que o destino se atrapalha nas brincadeiras e quando se supõe que nos deixou em paz - dias de saudade congelando o raciocínio, suas armações se entrelaçam e sem que ele perceba olha o imprevisto! Estamos nos encontrando, a sós, por acidente.

Se nossos encontros são casuais? Claro que sim! Quantas vezes eu ficar esperando na recepção, nos horários de rotina, vigiando todas as oito câmeras de segurança. Um olho na portaria principal e outro no hall da garagem, pois nunca se sabe quando a dona dos meus destinos chegará de carro ou pela entrada de pedestres. Nem bem o vulto aparece - sua silhueta me é inconfundível nas imagens preto e branco dos portões ou na filmagem colorida da garagem, eu vou para o elevador ao encontro de sorrisos abertos, porque ela sorri sempre, sem surpresas, como se soubesse tanto quanto eu que nossos encontros nunca são casuais... e mesmo que um ou outro fosse coincidência, este seria tudo, menos casual. Nossos encontros, mesmo nos elevadores, são tão acidentais quanto todos os outros encontros que eu me lembro.

Apesar de, as vezes, forjar o destino eu creio verdadeiramente nele. Creio também em cactos e na coincidência dos desencontros. Porém, acredito mais nas palavras que me escapam. As palavras não precisam de papel ou linhas para serem compreendidas, entretanto, eu não as compreendo... quero dizer, eu não compreendo o efeito delas sobre a mulher que se cala sempre que elogio sua beleza ou escrevo explicitamente sobre paixões. Talvez eu não escolha boas palavras, ou sua compreensão quando as vê diante de si seja diferente da razão para qual elas existam. Isso me obriga acrescentar um PS... Um Pós Escrito nas cartas explicando que as palavras - estas inclusive - foram escapando de mim por motivos variados, o principal deles é dizer dos meus sentimentos! Mas eu também deveria dizer que ela, a mulher, não tem culpa alguma nisso, na paixão que habita em mim. Se eu preciso eleger culpados, suspeito que coloque grande parte da culpa no solo fértil que é meu coração... Parte da culpa ficaria com os sorrisos sem surpresas diante de nossos encontros casuais. Outra parcela teria sua beleza - e como ela é bela! - que me faz capturar palavras, a maioria para serem guardadas em gavetas escuras, secretas. E quando não estou olhando minhas palavras se embaralham, escapam e criam outros sentidos. Nisso a culpa é toda da própria paixão, esse ser em mim que teima em vigiar as palavras mas não me deve nenhuma obediência.

Pronto, as palavras estão me escapando! A cada nova linha as palavras vão se misturando e neste exato instante o meu raciocínio, congelado pela saudade, insiste que o destino se atrapalhou e me fez saber de sua existência dez ou doze anos após o dia exato... A verdade é que gostar dessa mulher tanto assim só pode ser mais uma armação entrelaçada. Algum dia o destino, em nova distração, me permite encontrar o fio da meada e então não precisarei mais de palavras ou de encontros casuais. Na dúvida tenho plantado cactos.

Se não houver distrações transformo meu coração num deserto.