SEM
JEITO! | ||
Beto
Muniz | ||
Uma blusa? Não saberia escolher algo apropriado ao gosto pessoal da aniversariante. Um perfume? Poderia interpretar que eu tinha algo contra seu cheiro. Ou pior, que era uma insinuação sobre seu odor. Uma jóia? Não era pra tanto... No meio do dia restavam três opções e uma agonia. O problema era que eu me sentia na obrigação de marcar a data com um mimo. No fechamento bancário descartei a opção do buquê. As flores, coitadinhas, não tinham culpa de nada! Não poderia tirá-las dum jardim para transformá-las em presente de comemoração. Fiquei em dúvida entre um poema e uma caixa de bombom. Dona Zuleide, idade indefinida, meu braço direito e esquerdo, merecia muito mais que uma caixa de bombom, porém, fui obrigado a abrir mão dos doces quando lembrei de sua diabete. Estava pronto a rabiscar os primeiros versos de um soneto (vez em quando baixa o espírito de Vinicius de Morais em mim) quando me ocorreu que eu não poderia enviar poemas, correr o risco de ser mal interpretado e perder alguém tão discreto. Dona Zuleide chama de MOÇA todas as mulheres que me visitam... É a MOÇA da espinha; a MOÇA do cabelo vermelho; a MOÇA dos óculos azuis; a MOÇA da alface nos dentes; a MOÇA que anda só de calcinha pela casa; a MOÇA... E eu sou obrigado a descobrir pela referência quem foi que tocou a campainha... Bem, tem funcionado! Enfim, um bom poema sempre carrega suas metáforas, um versinho simples, tipo: "batatinha quando nasce..." pode conter conotações sexuais! Pela lógica das metáforas, para nascer é preciso ser plantado, para ser plantado tem que ser enterrado e molhado, enterrado e molhado lembra coito... Ser acusado de assédio? Desisti do poema. Então me veio uma idéia! A quarta opção: Um abraço acompanhado de tapinhas nas costas. Minutos depois, olhando bestamente para o jeitão de Dona Zuleide, não me pareceu uma boa idéia. Convinha evitar contatos físicos. Ela tava com cara de quem não grudunha um macho desde 1987, ano que perdeu o esposo atropelado por um trator da prefeitura de Embu. Gastei alguns segundos matutando e chequei a conclusão que nos últimos oito anos ela foi muito eficiente barrando vendedores de enciclopédias e impedindo a diarista de arrumar minha mesa de bagunças ordenadas. Dona Zuleide merecia era um substancial aumento no salário! Chamei-a e informei sobre os generosos 2,5% de aumento. Sabe o que a ingrata fez? Perguntou se finalmente teria direito a férias remuneradas! Demiti... Claro! | ||