ACUMULADA
Dênis Sevlac
 
 

Paralisado na frente da lotérica, Otávio olha o valor da Mega Sena acumulada. A quantidade de zeros à direita e pontos que os separam impressionando, os números em um papelzinho na mão esquerda.

Como em uma epifania, anotara os seis números de uma vez. Sabia que eles seriam sorteados. Era tudo o que sempre desejara: ter os números sorteados da Mega Sena acumulada nas mãos.

Quanta coisa faria com aquela dinheirama toda! Resolveria sua vida. Largaria aquele maldito emprego. Não teria medo sequer de largar sua mulher, aquela megera. Não precisaria mais temer a solidão. Poderia ter quem quisesse.

Compraria o mundo. Casas, carros, iates. Nunca entrou em um barco antes, nunca viu graça neles. Mas rico tem que ter iate, certo?

Montaria um negócio e... Pensando bem, viveria de renda, deixando o dinheiro trabalhar para si.

Não largaria o emprego tão rapidamente. Ficaria ainda um mês, só para aloprar. Chegaria tarde todos os dias, sairia cedo, faltaria. Quando estivesse lá, ficaria em sites de mulher pelada, bebendo cerveja gelada. Quando o chefe viesse falar alguma coisa, diria poucas e boas, humilhando o desgraçado.

E sua mulher, aquela vaca! Ela seria um problema. Se pedir o divórcio, levará metade da bolada. E, venhamos e convenhamos, não tem coragem de mandar matá-la. Mas não pode deixar aquelazinha rica também. Ela não merece nada. Nada!

Pensando bem, se os números são assim tão especiais, tão certos, podem esperar mais um pouco. Até que se livre da mulher, pelo menos. Quem sabe, quando puder jogar, o prêmio tenha até um valor maior.

Guardando o papel no bolso, Otávio vai para casa, desejando que a esposa tenha preparado o jantar.