UM GOL MUDA TUDO
Marcelo Maita
 
 

Era um menino desprovido de beleza. Feio! Mais feio que tombo com as mãos no bolso. Tinha um pouco mais de dentes do que diplomas na parede do Lula e suas gengivas sempre estavam mais por fora que bunda de índio. Seu sorriso era tão amarelo quanto o submarino dos Beatlles e mais sem graça que as piadas do Faustão. Tão distante dos outros alunos quanto o Oiapoque do Chuí e os professores não falavam com ele nem na chamada. Banho era algo sagrado para ele, um no natal e outro na páscoa, o que o fazia ter menos amigos que o Roberto Jefferson. Ninguém. Absolutamente ninguém, o queria por perto. Levava a vida na escola sem pressa, como o Rubinho na Ferrari. Mas a bola faz milagres.

Era semi-final do campeonato na escola, o jogo estava empatado em três a três e decidiram coloca-lo em quadra, talvez para assustar o adversário. Deu um, dois toques na bola, no terceiro chutou de bico mesmo. Não se sabe se a bola ou o tênis chulezento entrarou primeiro, mas foi o gol da classificação e sua consagração na escola. Todos o abraçavam e todas queriam tirar foto com ele. Passou de feio horroroso, para dono de uma "beleza diferente" - abstrata diria eu. Sempre ganhava o melhor pão na merenda e podia repetir o suco. Privilégios que só herói possui. Mas tudo isso durou até a final. Sua moral era alta, saiu jogando, botou a dez e a braçadeira de capitão, mas jogou tão mal quanto a seleção de noventa. O time perdeu e ele saiu vaiado. Tudo em sua carreira foi tão rápido como ser multado em São Paulo. Voltou a ser indigente e nunca mais tirou fotos. Foi esquecido como o fura-fila do Pitta e seu lugar no canto da sala continua lá, o único realmente fiel a seu dono.

O gol que fez, o garantiu nas fotos por um tempo. Foi querido e famoso. Mas o gol todo mundo esquece, já uma atuação ruim fica, como batom na cueca e marca sua carreira.

No futebol não a nada mais verdadeiro. Quem faz gol continua bonito na foto.