DURA VERDADE
Patrícia da Fonseca
 
 

Eu estava sendo traída.

Ninguém me disse e nem eu vi nada de suspeito contra o Marcos. Eram as atitudes dele, a distância, a conversa fiada que ele vinha para cima de mim quando dizia que estava chegando mais tarde do trabalho, por excesso de serviço. E as intermináveis partidinhas de futebol... Antes eram aos sábados pela manhã. Depois, além dos sábados, passaram também para os domingos à tarde. Confessei para minha mãe as minhas desconfianças. E ela me respondeu que homens eram assim mesmo. Homem que não traísse não era homem de verdade. Lógico que não concordei com esta definição simplista e conformista. E, aos poucos, a cada desculpa esfarrapada, fui ficando cada vez mais enraivecida com meu marido.

Deixei de fazer sexo com ele. Vai que ele não usava camisinha com a outra? Como é que eu ficava? O Marcos achou estranha aquela minha abstinência, porém eu também lancei mão da minha própria conversa fiada. Apelei para a boa e velha enxaqueca. Ele ficou desconfiado. Imagino que ele tenha pensado que quem estava pulando a cerca era eu. Bem que eu tive vontade, mas eu não achei foram candidatos ao posto de meu amante.

E teve uma noite que meu marido chegou mais tarde em casa, mais do que o costumeiro. Eu fiquei sentada, vendo a novela e ele entrou direto para o banho, sem nem olhar para mim direito. Fiquei furiosa. Deixei que ele abrisse a ducha do chuveiro e fui chafurdar nos bolsos e na carteira dele. Eu nunca tinha feito aquilo, nem com ele e nem com namorado algum. Eu precisava descobrir alguma pista, qualquer coisa que eu pudesse jogar na cara dele que eu estava sendo traída injustamente. E então, em um dos bolsos das calças, encontrei uma notinha. Era de uma sauna gay.

Cheguei a estontear. Meu marido em uma sauna gay?! Era o fim. Mas será.? Como eu nunca havia desconfiado de nada? Deixei a nota onde estava e voltei bem mansinha para ver a novela. Ele saiu do banho, jantou, conversamos algumas coisas e fomos dormir. Sonhei que tinha encontrado o Marcos de mãos dadas com um bonitão no shopping. Acordei e não consegui dormir mais. No outro dia, quando eu contei para o meu irmão - morrendo de vergonha - do meu achado, fui brindada com a excelente resposta que ele já desconfiava disso há muito tempo. E não só ele, mas como toda a família. Vexame total. Eu estava casada com um gay - não que eu tivesse algum preconceito, só não queria que fosse o meu marido - e era a última a saber. Lembrei que um dos meus melhores amigos na adolescência gostava de meninos e nem por isto a gente deixou de se curtir. Mas um marido gay eu não podia admitir.

Não suportei muito tempo e contei para ele o que eu tinha descoberto. Achei que o Marcos fosse negar, discutir e brigar comigo. Mas não. Ele respirou aliviado e confessou tudo. Sim, sempre gostara de homens. Tinha até tentado sair daquela vida quando a gente começou a namorar, mas isto durou só até o primeiro mês de casamento. Foi aí que ele conheceu o Alex. Paixão à primeira vista. Fazia dois anos que a gente estava casado e eu nunca tinha percebido nada. Por uma questão de coerência, pedi divórcio ali mesmo. Ele nem pestanejou. Aceitou na hora. Já estava mesmo com vontade de sair do armário. Bem rapidinho, ele fez as malas e saiu do nosso apartamento para o do Alex. Até nem fiquei muito triste. Mas, com certeza, o Marcos estava bem mais feliz do que eu.