NAS CURVAS DESSE TREM...
Djanira Luz
 
 

Às 16:00h em Madureira, no Rio, pegar o trem e voltar para casa era sempre um tumulto, uma aventura. Ana e Kátia se espremiam entre os passageiros para conseguir um lugar menos desconfortável, longe da porta.

Andar de um lado para o outro pelo trem, deixava Ana apavorada; Kátia já estava habituada com aquele meio de transporte, por isso tinha mais desenvoltura para transitar entre um vagão e outro. Kátia quis ir mais adiante, mas conhecia bem a amiga, sabia do medo que Ana tinha em atravessar a “sanfona” que liga um vagão a outro. Ela sabia também de que como Ana era mimada, além de muito persuasiva. Acabaria fazendo mesmo a vontade dela, pensando bem, Kátia nem quis insistir, preferiu parar por ali mesmo. Estava acostumada a ceder aos apelos chorosos de Ana.

As duas amigas tentavam ficar numa posição melhor possível, mas estava difícil. Naquele horário, o trem vinha lotado. Em certo momento, Ana perdeu o equilíbrio, agarrou o braço da amiga, pois não havia como e onde se segurar. Ana não compreendia como Kátia ficava equilibrada e calma dentro daquela lata de sardinha pulante, enquanto ela se esforçada em manter-se em pé. O trem seguia. Numa curva que vai chegando próximo à estação de Deodoro, Ana tentou segurar no cano, mas um homem alto e forte estava encostado nele, dificultando pra ela segurar, também muitas pessoas já estavam segurando naquele cano. Não tinha jeito mesmo!
Quando a curva acentuou, Ana com medo de cair em cima de alguém, pôs rapidamente, de qualquer maneira, a mão por detrás do homem alto, quase que dando um abraço naquele estranho e tentou segurar o cano... Mas para surpresa de Ana, não havia segurado o cano. Ela teve uma sensação estranha: sentiu que esmagava alguma coisa gelada... nisso, ouviu uma voz feminina extremamente irritada aos berros:

- Desgraçada... meu picolé!!!

Kátia viu Ana com a cara mais pálida assustada tentando sair daquele lugar e perguntou?

- O que aconteceu, Aninha? – sem saber que a tal “desgraçada” era a sua amiga.

Ana, num misto de espanto e riso, só conseguiu dizer:

- É de uva! – disse sacudindo a mão melada de picolé.

Ana não viu a dona daquela voz, e nem pretendia ver. Nessa hora, os cinco sentidos de Ana estavam à flor da pele: sentia o seu corpo em contato com os corpos dos outros passageiros enquanto empurrava Kátia para outro vagão; o som da voz aguda da mulher irada soava em seus ouvidos; os olhos ávidos e atentos para escapar dali; o cheiro doce do picolé de uva em suas mãos denunciando o “crime” que cometeu; Ana sentiu um gosto amargo na boca... era pavor!

Dois vagões à frente, Ana contou o que havia acontecido para a amiga e as duas caíram na gargalhada!

- Não tive culpa, foi aquele homem gordo que estava encostado no cano que me impediu de ver onde e o que segurava. – justificou Ana.

* * *

Depois deste episódio, Ana preferiu ir de ônibus para o cursinho. Não mais por medo de andar de trem, e sim para não correr o risco de cometer outra confusão, pois nisso era ela boa... estabanada!