ACESSANDO UM ASSESSOR
Raymundo Silveira
 
 

Procurei acessar um assessor. Nada havia. Logo, nada via. Tratei de tratar um vice, se vice-assessor eu visse e me ouvisse. Também não havia. Ainda era cedo, por isso cedo ao desejo de prosseguir a busca. Ao meio-dia, já meio cansado, desisto. Depois do almoço, vou ao moço do elevador.

- Proibido fumar?

- Charuto? Não...

Acendo um e ascendo ao quinto.

- Ando a cata de um assessor. O ascensorista me indicou...

- Por enquanto não há.

- Acato. Não me exaspero: espero.

- Não precisa. Há substituto precisamente à sua frente.

- Nesta secção?

- Não está havendo sessão, moço.

- Nem cessão de direitos?

- Não! Em frente.

- Enfrente? Ele é valente?

- Boa tarde, senhor assessor.

- Boa tarde. Não sou assessor, sou vice.

- Seja... Gostaria que me ouvisse

- O que deseja?

- Tratar de um assunto junto a essa assessoria.

- Acerca de...

- Cerca.

- Está brincando?

- Não brinco; apenas uso.

- Usa o quê?

- Brinco

- Já vi. Muito bem. Acerca de que cerca o senhor quer tratar?

- Acerca da cerca da minha casa. Foi derrubada por um trator.

- E não tratou de consertar?

- Não tem conserto. E ainda que tivesse, hoje tem concerto.

- O senhor está a fim de me gozar?

- Não senhor. É que tenho um tio afim que é músico e fiquei de levá-lo ao conservatório.

- Conserva o quê?

- Não conservo nada. O senhor é quem tem de conservar. Não estou disposto a pagar imposto e ficar exposto aos marginais.

- O que quer que eu faça?

- Autorizar logo o conserto da minha cerca, para que eu possa ir ao concerto.

- Logo? O assessor não está. Logo, tem de esperar.

- Espero. Não me desespero.

- Quanto tempo tinha a sua cerca?

- Dois anos.
- Não falo do senhor. Já vi que tem dois ânus. Falo da cerca.

- Agora o senhor quer me humilhar... Fui operado há cerca de três meses. Ainda não me acostumei.

- Bem, já que o senhor está bem, bem podia mandar reconstruir a cerca.

- Tudo bem. Contanto que me dêem tanto...

- Quanto?

- Cerca de dois mil.

- Tanto assim?

- Sim

- Cerca de dois mil? Era cerca de ferro?

- Não. Era de pau.

- Que sujeito pau! Tome. Não tome mais meu tempo. Pegue o cheque.

- Xeque!