JANTAR
Francine Ramos
 
 

Respirei. Meu talher sujo, minhas mãos tremidas. O prato branco estava sujo, a toalha com flores rubras bordadas na ponta tocavam-me suavemente. Dali, eu ouvia vozes.

Do meu lado esquerdo alguém sussurrava, do outro lado uma gargalhada. Eu tentei ouvir os sussurros, tentei não sorrir. Foi difícil, porque eu sorrio quando as outras pessoas riem também. Gargalhadas altas, elas me causam riso. Mostro os dentes por vergonha dessas pessoas. E dentro de mim fica uma voz que diz para elas não rirem assim. Eu sorrio em silêncio.

Depois vou para um segundo estágio, fico com vergonha de mim, de não sorrir com barulho. Sorrio para mim mesma, não sorrio para você, tenho vontade de dizer. Porém não digo.

A mesa já deveria ter sido retirada, as pessoas já deveriam ter feito aqueles singelos sinais para começar a despedida. O jantar estava ótimo, que tempero utilizou? Ah, sim, especiarias indianas. Ótimo!

Eu sinto vontade de sair antes de tudo isso acabar. Foi uma amiga do colegial que me ensinou a saída a francesa. Utilizo sempre que posso. E queria ser um mosquito para ouvir as pessoas. Onde está aquela mulher dos cabelos longos? Aquela calada que parecia me olhar tanto? Sim, este é o nome dela? Nome exótico, tanto quanto ela. Será que ela aceitaria um convite para ver uma exposição de Monet?

Eu gostaria que as pessoas se referissem a mim dessa forma. Mas não deve ser nada disso. Pode ser melhor, ou pior. Só não quero que não haja nenhuma referência a mim quando não estou presente.

Agora eu estou pensando que continuo a gostar de escrever. É mais prazeroso histórias mentidas do que as verdades pálidas.

Quantos talheres sujos de vermelho pálido. Quantas pessoas nesta mesa desarrumada fingem um rubor pela vida tão pálido. Talvez eu seja como elas. Tampouco eu precise de mais uma dose.

Preciso ir para a casa, vou chamar um táxi. Lá fora chove. Respiro. Começo de novo.