DEZ MINUTOS
Maria Cláudia Gaiannes
 
 

Estava tranqüila em meu quarto, observando a fumaça de um incenso que se alastrava, dançava, ficava no ar... Eu respirava longamente, tentando absorver um pouco daquela magia. Pela janela a tarde quente ia embora. Deslizava pelas nuvens os últimos raios de claridade, era bonito e calmo, triste e cheio de esperança.

De repente, lembrei-me que havia marcado um encontro com uma grande amiga para às oito horas, olhei para o relógio e faltavam apenas dez minutos para às oito. Era melhor já ir saindo, para poder ir com calma, sem pressa. Mas eis que, ao querer abrir a porta do quarto, ela não abriu. Já fazia algum tempo que a porta estava com este problema, você fechava ela por dentro, mas ela só abria por fora. Sempre prometia que chamaria alguém para consertá-la no dia seguinte, mas...

No primeiro momento não me abalei, era só chamar por Maria, minha querida e fiel assistente do lar, que ela viria abrir, como já tinha feito várias vezes desde que este problema começara. O primeiro chamado. E nada. Nenhuma resposta. Desliguei o som e pude perceber que a casa estava em total silêncio. Onde Maria teria ido? Ela nunca saia sem avisar... O segundo chamado foi quase um grito. E nada. Senti uma onda de calor inundar meu corpo e faltou-me a primeira molécula de ar. As grades na janela riam de mim, eram tão seguras que jamais me deixariam escapar.

O terceiro foi um grito, alto, ensurdecedor. E nada. Cinco minutos para às oito, o suor brotava das mãos. Perdi uma segunda molécula de oxigênio. Tentei voltar a minha calma, mas a fumaça do incenso agora me lembrava o começo de um incêndio, e eu estava ali, presa, queimaria até o fim sem que ninguém viesse abrir a porta, achei melhor apagá-lo.

O quarto grito, já cheio de angústia. E nada. O quinto grito, quase sem força, já rodeado de lágrimas, porque ninguém, nunca, viria abrir aquela porta. E nada.

Deixei-me em prantos, meus sonhos, meus planos... Tudo poderia ser impedido por uma porta, tão grande, tão forte. O oxigênio ficou escasso, mesmo pondo o nariz para fora da janela não podia sentir o ar, porque havia aquela porta, aquela porta fechada, burra, inanimada, que não abria!

Mas eis que, ouço um barulho na cozinha, sim barulho de panelas, Maria havia voltado. Enxuguei meu rosto, me recompus na serenidade, recolhi todos os meus sonhos, todos os meus planos e, chamei por Maria, com toda naturalidade do mundo. Ela veio, girou a fechadura e abriu a porta. Nunca soube do que se passara ali, achei melhor não contar, ela poderia se sentir culpada por uma morte que, enfim, não aconteceu.

Antes de sair ainda olhei para o relógio, oito horas em ponto, chegaria um pouco atrasada ao meu compromisso. Incrível como nunca consigo ser pontual! Quando saí, dei uma boa respirada e nunca a noite me pareceu tão plena, tão linda, tão imensa quanto a liberdade!

Mas sabe, agora relatando esses acontecimentos me lembrei que ainda não consertei a fechadura daquela porta...