AH POETA!
Osvaldo Pastorelli
 
 

Decepcionou-se ao descer na rodoviária. Esperava um grande movimento, mas para os padrões dos fins de semana, ela estava vazia.

Comprou a passagem e se dirigiu à plataforma.

Quinze minutos depois estava sentado na poltrona confortável descendo a Anchieta.

- Uma coisa que me deixa admirado é esse trânsito.

- Por que? - respondeu o sujeito sentado ao lado dele.

Trazia ao colo uma sacola com duas garrafas onde se lia nos rótulos: Aguardante.

- Quase sempre é horrível, chega-se a demorar às vezes duas horas para descer a serra, e, hoje, apesar de ser fim de semana, o trânsito flui normalmente.

- Sua observação é meio sem sentido.

- Acha?

- Acho.

- E porque?

- Porque?

- É porque?

- Ora, eu subo e desço a serra todos os dias.

- A serviço?

- Mora na baixada e trabalho em São Paulo.

- Entendo.

- Os únicos dias que o trânsito se torna péssimo é nas férias escolares e nos fins de semanas prolongadas.

- Imagino.

- Vai a passeio?

- Vou participar de um lançamento editorial.

- Ah! Escritor?

- Nas horas vagas pode-se dizer que sim.

- É bom ter uma atividade fora daquilo que fazemos no dia-a-dia.

- E se for uma atividade reconhecida melhor ainda.

- Qual a sua atividade?

- Profissional ou intelectual?

- Profissional.

- Auxiliar contábil.

- E intelectual?

- Escritor.

- Ah! Poeta!

- Esse: “Ah! Poeta” soou irônico como se dissesse: que droga!

- Nada disso, foi é de admiração.

 
 
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