O
MONSTRO NOSSO DE CADA DIA
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Adão
Jorge dos Santos
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Não havia dúvida alguma. O monstro ainda estava lá. Era enorme e assustador. Fugir nem pensar. Era durante a noite que a criatura se manifestava, ela saía dos meus pesadelos mais profundos e ocultava-se nas sombras do quarto. Com certeza ele não era real. Não poderia ser. Não havia monstro algum no quarto. Era tudo fruto de minha fértil imaginação. Eu tinha a certeza de que havia criado o monstro e, sabia, portanto, que ele não me queria fazer mal, porque se quisesse, não teria como escapar. Mas, se não existia monstro, o que era aquilo que estava rosnando no escuro do quarto? O monstro às vezes ficava invisível, peculiaridade própria e exclusiva desses seres rastejantes, sumiam que nem mesmo o seu cheiro se fazia sentir no ar. Talvez ele fizesse isto por pura maldade,ou ,quem sabe, quisesse dormir um pouco. Quando isto acontecia, eu conseguia respirar um pouco mais aliviado, parecia que a vida não era tão pesada, que era fácil de se viver. Mas quem, entre nós, conseguiria viver com um bicho daqueles rondando a nossa vida? Eu com certeza não conseguiria! Eu não conseguia pegar no sono. O medo de ser devorado pela criatura era mais forte de que qualquer coisa. Eu sabia que cedo ou tarde o monstro iria me devorar por partes: primeiro seria minha autoconfiança, depois acabaria com o meu sossego e a paz que tinha antes dele aparecer. Eu só tinha um pensamento; escapar das garras do monstro. O monstro não tinha pressa.Ele apenas esperava. Tinha fome. Muita fome, afinal ele era um monstro. Se tivesse sido alimentado todos os meses, nas datas certas, não estaria com tanta fome assim. Mas as pessoas eram estranhas, preferiam criar monstros dentro de suas casas como se fossem animais de estimação. Esqueciam que os monstros não se adaptam a vida domestica, jamais seriam domesticados, eram monstros e ponto final. O monstro cresceria e ficaria incontrolável, e um dia iria com certeza, destruir quem o havia criado. Todos os dias criamos monstros, faz parte da nossa vida cotidiana, e cabe somente ao homem, este ser civilizado, a convivência pacífica ou não com estes crocodilos nossos de cada dia. |