TUDO PASSA, TUDO PASSARÁ
João Rodrigues
 
 
Desde os tempos de infância Geni amava o transitório. Fiquei sabendo de tudo isso em uma cervejada numa sexta-feira depois da aula. Ainda brincando de casinha, adorava ser a dona de casa, enchia-se de bonecas de pano feitas pela avó, que passavam a ser suas filhas. E as amava. Amava-as eternamente por um ou dois dias, e aquelas filhas tão queridas acabavam ficando esquecidas dentro de uma caixa em cima do armário, quando não ficavam jogadas nos cantos da casa ou no fundo do quintal. Depois vinham as panelinhas de barro, feitas pelo um tio artesão. Ah, como eram lindas! E Geni passava a ser uma cozinheira dedicada que fazia comida para todas as bonecas das amiguinhas, até não aparecer outra novidade. Amava a tudo, e tudo passava. E assim ela entrou na adolescência.

Morria de paixão por Marquinhos, um skatista da quinta série. Arrumava-se toda para ele, mesmo que ele sequer imaginasse que ela o amava. Durou duas semanas. Depois veio o Léo, o Vagner, o Caio e muitos outros. Com alguns ainda ficou uns dias, com outros a paixão acabou antes do primeiro beijo, rápido, assim como a mudança que fazia em si mesmo. Ora tinha cabelos loiros, ora vermelhos; em um dia colocava um piercing no umbigo, no outro mudava para os lábios. Muitas pessoas afirmavam que ela não tinha personalidade; outras diziam que ela possuía várias. Nada posso afirmar a respeito, pois não entendo muito do assunto.

Conheci Geni no primeiro ano de faculdade. Ela trancou o curso de Direito – no terceiro período – e resolveu fazer Letras. Até aí tudo bem. Todo mundo faz escolhas erradas. Só não sei se ela errou ao trancar a matrícula de Direito, ou quando decidiu fazer Letras, curso que ela abandonou dois anos depois, pois resolvera morar com um antigo namorado, por quem, segundo ela, sempre foi louca de paixão. Ninguém acreditou.

A última vez em que ouvi falar dela, ela estava de bem com a vida, muito satisfeita consigo mesma e afirmando que dessa vez estava realmente fazendo o que sempre sonhara. Estava trabalhando em uma boate na praça Mauá, como dançarina. Pode ser que tenha encontrado sua verdadeira vocação. Algo bem pouco provável. Pois Geni é um rio que passou em sua própria vida. E, que logo passa, como tudo passa.