AL-ANON
Francisco Pascoal Pinto de Magalhães
 
 

Ilhado. olhos vermelhos de súplica e uma sede de nunca acabar. Necessita de ajuda. Ou de um bom trago.

Na placa sob o viaduto, pequenas, as letras se embaralham. Quase não consegue lê-las.

AL-ANON, está escrito. Nome de oásis. Em seu delírio cotidiano camelos de óculos escuros, barrigas coladas ao balcão, bebem cerveja, comemoram, discutem futebol.

Ignora-os. Firma o caráter por uma fração de segundo, estuda o terreno, calcula o próximo passo, tateia, apoia-se, desce os degraus.

Entra. Seja bem-vindo. Sente-se. Fique à vontade.

10:30 da manhã. Alcóolicos Anônimos do Viaduto Pedroso. A sala é abafada e recende a álcool. Noventa e nove por cento transpiração, um por cento determinação.

Um mantra é recitado à exaustão:

"Meu nome é...

"Olá..."

"Não bebo uma gota de álcool há... dias"

Mãos trêmulas aplaudem. Náufragos. Estão todos ilhados. Um arquipélago inteiro.

Sai. Talvez se conforme - shikata ga nai!*. Talvez compre uma garrafa, esvazie-a e rascunhe no rótulo um pedido de socorro. Talvez.

*shikata ga nai, uma expressão japonesa que significa "não há nada que se possa fazer a respeito"