NÃO
ME LEVE A MAL, HOJE É CARNAVAL
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Bárbara
Helena
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Começou com uma bolinha no braço. Coçava um pouco, deu de irritar e virou pústula sangrenta. Logo fez inchar o rosto, o tronco, invadiu as pernas. Aconteceu com todos da bateria. Excrescência rosada que se alastrava feito praga. Impossível atravessar a avenida. Depois foram as passistas, a madrinha, a velha guarda, os integrantes das alas. Ninguém morreu, ninguém se recuperou. Sonho virou pesadelo. Uma fúria imensa, misturada com depressão se abateu sobre a Imperatriz da Serra. Campeã irrefutável dos últimos desfiles, estandarte de ouro confirmando a consagração popular. Só podia ser praga, ebó dos vencidos deixada na encruza, era tudo uma corja de invejosos. Telefonemas aflitos para médicos e hospitais, mensagens histéricas entre passistas e diretores. Nada adiantou. Não havia como entrar na avenida com um cortejo de inchados, pustulentos, rastejantes. Não havia como tocar o surdo, o repique, a zabumba, o pandeiro com dedos que não dobravam, insensíveis, sangrentos. Só se for para homenagear São Lázaro, arriscou um gaiato, fulminado pelo olhar do carnavalesco. Ironia é para castigar adversários, não ridicularizar sofrimento de aliados. Mas a verdade era esta - lazarentos ou nada. Decidiu-se o Nada. Faltava uma semana para a folia e a Imperatriz estava fora. Comunicaram oficialmente à Liga. Televisões, rádios, jornais e blogs, que acompanhavam o drama das misteriosas bolhas, noticiaram a tragédia da escola de Bangu. Uma grande perda para o carnaval carioca eram as manchetes do dia. Só pode ser praga - repetiam carnavalescos, costureiras, construtores de alegoria, pedreiros e marceneiros desempregados. *********** Priscila, rainha do deserto, Eleutério na certidão de nascimento, atravessou a pinguela sobre o rio fétido em direção ao barraco mal iluminado no alto do morro. Três batidas curtas e a porta se abriu para uma sala avermelhada na luz de muitas imagens. - Trouxe o combinado, minha mãe. A Imperatriz foi pras picas, como a senhora prometeu. Minha escola vai ganhar. A mulata gorda sorriu - Num tem percisão mais. Priscila se espantou, insistiu em pagar, enquanto mentalmente calculava o que poderia aumentar, com a grana economizada, na fantasia de destaque. -
To dizendo que num tem percisão. É só ficá
de boca calada. Os da encruza e os homi de Bangu acaba cum nois. Fica
na tua, a gente nun si conhece, falô? - Juro, minha mãe. -
Então vai, fia, rápido! Priscila atravessou a pinguela, começou a sentir uma coceira no braço. Olhou, era uma bolinha rosada, com uma ligeira auréola branca. Mal atingiu a rua lá embaixo, apavorada, quis voltar. Os pés se arrastavam, inúteis. |