SACANAGEM
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Alika
Finotti
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Alvorecer em meio à madrugada: morcego de metrópole, cegueira do peremptório da estrela da manhã, dança de quem sabe que o livre-arbítrio é a declaração de férias eternas de Deus. Entorpecido de exótico, curandeiro matreiro, amante de farofa com feijão, gengibre e banana; pra refrescar, chuva de caldo-de-cana, ou, de seu repique, o suco do alambique. E por falar em repique, que pique!, cá, entre nós, o desta nação de estrimilique - Tão Brasil! A mulata ainda não sabe que vale mais que o petróleo todo do Oriente, o caboclo ainda não sabe que vale mais que o maior segredo do Bill Gates. O taxista se guia melhor pela capital que o Google pelo digital, sem falar do povo todo de São Tomé das Letras, Alto Paraíso de Goiás e Boipeba, que é quem mais a terra eleva, e se lhes confundem por ameba! O empresário odeia a criança carente que vive na faixa de pedestres, e é tudo culpa da paella da política - Tão Brasil! Gente que bole, pinica, batuca, ardor meio mole, que fuxica e cutuca. A Amazônia virando ração pro Big-Mac europeu, a seca na Patagônia assunto de zé-bedeu. Árvore marchando pra baixo, povo sofrido, ungido, desdiscutido. A dona de casa burguesinha com medo de juntar côco e sabão, e a doméstica guru dos pimpolhos ensinando a lição - Tão Brasil! Ai, desta Babilônia em verdeamarelo; umbu, candomblé, estupor cálido singelo: jumento empacado, churrasco no sobrado, hot-dog prensado, samba inusitado. Pizza de sushi com guaraná, aquele velho jeitinho aqui e acolá. Jobim, Buarque e Bandeira, enchentes, a desgraça corriqueira - Tão Brasil! O caixote de papelão da tela de plasma de quarenta-e-duas lar do mindingo, o meio-fio da avenida corba bamba, medo da vida. Ai, do tucano, do papagaio, funesto engano, tanto crime de soslaio, e a bufunfa rainha da sucata. Cidade que não sonha, do trânsito, da pamonha, manicômio a céu aberto, infidelidade tamanha. Carioca desenhando o Audio-Pax, mineirinho numa boa, no relax, a Copa do Mundo o circo, e - o pão?: humilhado mundrungo - Tão Brasil! A pia cheia de louça, nem me fale!, a antipatia da moça, não se me entale!, tanto riso gutural debaixo da ponte, tanto mestre estulto, guerrilha de fuzil e peixêra. A China sorrateira zunindo, o zumbi frente à novela, fugindo. Bundas e ciúmes, Bündchen e Macunaíma, o mundo na rodovia e o esplendor da cotovia - Tão Brasil! Ganzá, banza!, trio-elétrico, desfile da senzala. Manga, jaca, beija-flôr e Portela, o linguajar de favela. O gringo fazendo safari no morro, se achando, - sumiu e nunca mais se achou! Guanabara, São Jorge e, bem, Jorge Ben. O dragão do imposto, pirataria e desgosto: boca na botija!, e, faz favor, aquele chorinho?... De lambuja, Senna, Chatô e Pelé, o azul de Itacaré - Tão Brasil! Mais um trago, a saideira!; maracatu, mandacaru, pirarucu; boto rosa, verso prosa, a tonga da mironga do cabuletê. A sonsa estroncha, a pomba no asfalto, o dengue serelepe, o riso mequetrefe. Malandro, calango, patrão bonachão, ribeira e ribeirão; um tique, um soluço, atchim!: que abuso! De bruços, teu busto; cosquinha em teu buço: capoeira, balada, treta, nonada! - Tão Brasil! |
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