CRÔNICA DE MEIA LUZ
Maria Cláudia Gaiannes
 
 

Na rua 15, na quinta casa, pintada de uma cor laranja meio feia, cercada por um muro verde meio velho, havia um ambiente simples e delicado, que uma oscilante luz amarela sempre testemunhava.

Mônica e João se amavam, porém, de uma forma desigual.

Mônica amava João com forças desmedidas, João a amava com forças moderadas.

As forças moderadas de João, além de serem um tanto fracas, apegavam-se em grande parte aos dotes culinários de Mônica.

Ela sabia disso, e se dedicava com esmero em cortar os legumes bem fininhos, engrossar bem o caldo do molho, dando a ele um leve toque de ervas finas, com o que João se deliciava.

Com os doces o emprenho era dobrado, pois, sempre eram recompensados com beijos ainda melhores.

E os dias iam sendo entrelaçados aos cheiros mais diversos e os sabores mais apurados.

Até que João conheceu Sophia e todos os seus desejos se transformaram, o melhor cheiro para ele tornou-se o cheiro de Sophia e nenhum sabor superava o de seus lábios.

Mônica mastigou a notícia, mas não a engoliu, sentiu seu gosto amargo e amargamente sorriu. Preparou um bárbaro jantar, do qual João tentou se esquivar, porém, não conseguiu.

Na noite seguinte João foi servido entre garfos e facas cuidadosamente polidos.