TRANSLUCÊNCIA
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Luísa
Ataíde
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A
verdade não está lá fora, a verdade está
dentro de você.
_ O que vocês querem aqui? gritou alguém do outro lado. _ Estamos de passagem, não devemos nos demorar. O homem ladeado por dois soldados de armadura cruzou os braços ao peito, pernas entreaberta, falou em cochicho ao que estava do lado esquerdo:
-Quantos deles você consegue ver? _ Vocês estão doido ! - disse o outro soldado , não vejo ninguém. O que nada via olhou os companheiros assustados: _ Vocês tomem cuidado com o que acham que estão vendo. Nossos companheiros que desapareceram, começaram vendo vultos do outro lado da ponte. Vocês sabem que esses caras levam o pessoal daqui e nunca mais eles voltam. _ Voltam sim. Tenho a impressão de conhecer alguns deles. Disse o chefe, ao que concordou o outro soldado. _ Vocês vão embora com esses caras? E o nosso grupo, o que será deles sem você chefe? _ Você pode vir também. De que vai adiantar voltarmos. Somos escravos dessa organização. O que nós fazemos além de vigiar dia e noite. Ficamos preparando panelas e panelas de ácido para distribuir nas festas que nem sabemos o que comemoramos. E o que fazemos depois? Brigamos e gritamos a noite inteira. Não há um minuto de descanso. Nem dormir podemos. _ Eu fico,disse o soldado. Estendeu a mão ao que estava no centro buscando o distintivo de chefe da milícia. _ Vem conosco Selt. Será melhor pra você. _ Cara eu vou encontrar o que? Quem? Não vejo ninguém do outro lado da ponte. Os dois soldados despiram a capa que traziam sobre os ombros, retiraram a armadura, e toda a roupa de baixo. Corpos nus sob o céu escuro. Os pés descalços cruzavam as tábuas de madeira, com extremada cautela. Prendiam as mãos nos pequenos fios laterais que prendiam precariamente à passagem rota. Selt,o soldado que ficara prendeu o distintivo ao peito, bateu forte na armadura e puxou com força uma das cordas que se estendia à frente. A ponte precária estremeceu e os dois homens se dependuram entre os fios. Os que aguardavam do outro lado, saíram em auxílio, puxaram os soldados pelos pulsos . Eles olhavam aterrorizados o abismo negro sob as cordas. O grupo agora reforçado por dois novos companheiros, abriu um pequeno círculo frente à ponte e deram-se as mãos. A escuridão da noite foi entrecortada por pequenas luzes que passavam entre eles cortando o espaço em movimentos circulares como os ponteiros de um relógio. O
homem sozinho do outro lado chutou as roupas e as armaduras em direção
ao abismo. O barulho do metal sobre as pedras era um grito de guerra
no silêncio da noite. Olhou o grupo que desaparecia na noite úmida,
bateu a ponta da lança no chão e gritou o mais alto que
conseguiu: |