MINI-CONTOS
DE 2006
continhos de natal dos anjos de prata | |
NATAL A mesa farta, vinhos envelhecidos são abertos, champagne francesas são brindadas. Há risos por toda parte! Natal A mesa vazia, pensamentos absortos, nenhuma expectativa! Natal O peru defumado, as frutas variadas decoram a mesa enorme. Crianças sorrindo, brincando com os novos brinquedos... algumas reclamam "puxa, de novo outro carrinho de controle remoto?" Natal A tv preto e branco ligada, as fantasias de um lindo natal fluindo pela tela. Pobres carinhas com um sorriso franco no rosto por terem ganho um brinquedinho simples: há um brilho intenso nos olhos da menininha que se encanta com uma bonequinha comprada numa loja de R$1,99; o garotinho se agarra ao carrinho de plástico que ele tanto queria. Natal Entre a fartura na mesa e a mesa em que tudo falta há a presença do menino Jesus. Que Ele esteja em todos os lares, seja do rico do pobre. O importante é que a Sua presença é que se faça ser vista, pois a comemoração é para Ele. A comemoração é pelo seu nascimento. O nascimento do nosso Salvador. | |
ESPERANÇA
SECRETA Quando Pedro espreguiçou as pernas finas e mal nutridas, lembrou que era Natal. Pensou na árvore, nas bolas cristalinas, nas pessoas felizes e nos panetones. Não tinha árvore, não tinha enfeites, nem uma família. O panetone nunca provara. Ele voltou o olhar a rodovia cheia de carros. Ali era o seu quarto, sob o céu cinzento do verão. Sorriu. Não tinha neve, não tinha presentes. Mas era um dia especial, e por isso valia à pena respirar sentindo o ar mais cheio e saboroso. Tinha a esperança secreta de ver o homem de vermelho cair de alguma chaminé invisível. E quando isso acontecesse, se esconderia no saco de presentes que tanto ouvira falar. Nunca
mais estaria só. | |
PAPAI
NOEL O Natal em família do ano passado foi inesquecível para as crianças. Meu irmão foi escalado por todos para ser o Papai Noel. No início, ele protestou um pouco, afinal de contas, não achava justo que só porque estava um pouco acima do peso tinha que ser ele o bom velhinho, mas depois se convenceu de que além desse quesito importantíssimo, ele também tem uma outra qualidade imprescindível: é o mais animado da família. Para que as crianças não descobrissem sua identidade, resolveu usar um óculos escuro e ficou, digamos assim, muito exótico. Os maiorzinhos logo perceberam que era ele o Papai Noel, mas disfarçaram afim de que os pequenos acreditassem que estavam mesmo diante do bom velhinho. O filhinho da minha prima, que ainda não tinha completado 4 anos, ficou encantado, seus olhinhos brilhavam de fascinação e ele ficou mais contente de se sentar no colo do Papai Noel, do que de ganhar presente. O mais engraçado foi quando meu irmão perguntou a ele se tinha se comportado bem e ele disse que não. Então meu irmão ficou sem sabero que fazer e depois de gaguejar um pouco, disse que ele ia ganhar o presente mesmo assim e o menino ficou com cara de quem não entendeu nada. Depois ele comentou com uma das priminhas que o Papai Noel era realmente um bom velhinho, porque dava presentes até mesmo para os que não tinham se comportado bem... | |
A
VIOLINHA De madrugada acordei com a gritaria de meus irmãos a abrirem seus presentes. Ao descer da cama, desesperado, acabei pisando com força em alguma coisa: era meu presente, que papai havia colocado ao lado da cama. Ao rasgar o papel lá estava ela: uma linda violinha de madeira envernizada, agora uma massa informe, quebrada. A dor foi imensa, e hoje, décadas depois, ainda sinto nas mãos a mistura de cavacos de madeira, cordas e lágrimas. Foi um Natal melancólico, porém inesquecível. | |
REPETITORE Beto Muniz Nasceu Jesus! Badalam os sinos, o amor inebria o mundo e até os miseráveis vislumbram a felicidade. Todos têm um só pai, um só objetivo e magoas antigas são esquecidas num abraço. Entes queridos chegam, famílias se completam, irmãos esquecem o ontem, que vida é futuro e amanhã será um novo ano, nova vida, novas esperanças. Tempo de renovar as promessas, pular ondas e comer lentilhas. Roupa branca, coração puro... Às vezes saudade, pontinha de tristeza que passa logo, afinal já é carnaval. O sorriso brilha, a serpentina serpenteia, os paetês sobejam, plumas pavoneiam e enredos enredam multidões! Termina tudo em cinza, quaresma, penitência, comunhão com a dor de Jesus crucificado. | |
PEDIDO
AO PAPAI NOEL Sabe Papai Noel, já faz quase uns cinqüenta anos que não acredito mais em você. Comecei a desconfiar naquela noite que ganhei o jipinho do exército. Eu e a Leilinha notamos sua cara de papelão e a barriga de travesseiro. Pensou que nos enganou né? Crasso engano, por isso mesmo, nunca mais te pedi nada. Mas agora uma necessidade premente me leva a pedir empatia pra toda humanidade. É caso emergencial. Empatia para as esposas e maridos, pais e filhos, patrões e empregados, para os que governam e para os que criticam, e ainda, para os que comemoram o Natal. Para o aniversariante não precisa; ele já tem. | |
NATAL
NA SIBÉRIA | |
CLIMA
DE NATAL O clima estava diferente. Havia mais pressa no caminhar. Três semanas ficara com a avó, sua única referência de vida. Quinze anos; o pai nunca conheceu; a mãe não sobreviveu à miséria. Os hospitais sempre lotados para as dores sussurradas da avó e seu destino uniu-se ao da filha. Clara ajeitou sua caixa de balas. Muitos carros passaram; as luzes opacas da cidade deram lugar ao colorido do espírito natalino; desfilavam figuras desajeitadas de papai-noel; homens e mulheres equilibrando sacolas e gritos com as crianças. E numa noite qualquer uma estrela brilhou mais forte. Sentada no meio-fio, Clara se permitiu chorar e pedir um destino melhor. | |
DESCONTO
DE NATAL Durante o ano todo ele se comportou direitinho. Seguiu os dez mandamentos, inventou outros três, respeitou mais alguns. Nem era cristão, mas achou melhor não brincar com essas coisas. Também deu provas de cidadania: jogou o lixo no lixo, não andou na contramão, não fumou no elevador, ajudou as velhinhas decrépitas a atravessarem a rua e, principalmente, não sonegou o imposto de renda. Ah, o imposto de renda. Seu bom comportamento valeu até no futebol, já que se eximiu de xingar a mãe do bandeirinha corrupto. Pensou que por ter sido um bom menino mereceria um belo presente debaixo da árvore. Quase esqueceu que era ele o Papai Noel. | |
SÓ | |
UM
EXEMPLO | |
NÃO
ESQUEÇA DE AGRADECER É noite...brilham luzes, aromas, sorrisos. Nas casas as reuniões...uniões...abraços e olhares voltados para os presentes. Presentes palpáveis, saudáveis, saudosos... É noite...crianças com olhos atentos para a janela. Esperando Papai Noel, na inocência que a magia envolve com alegria. Alegria dos sonhos, risonhos, suaves... É noite... adultos com pensamentos distantes. A retrospectiva do ano alegra, alerta e descortina sentimentos sobre ações. Ações bem feitas, mal feitas e não feitas... Vagando em meu momento brevemente nostálgico, volto a realidade e o interrompo para o 5...4...3...2...1...FELIZ NATAL !!! E após os cumprimentos, é hora de fazer uma prece a Deus para agradecer pela vida, pelo ano de alegrias e batalhas, pela família e pelo amparo, além de cantar um Feliz Aniversário a Jesus, pois a comemoração e a união são graças ao seu nascimento. | |
NATAL
INESQUECÍVEL Maria cresceu brincando naquele mar, onde se viam baleias nos natais. Um dia Maria, menina, engravidou por obra e graça do divino espírito santo e, tendo ao ventre, o fruto da sedução, foi dá-lo à luz noutro lugar. Uma menina nasceu numa páscoa enluarada. Os pescadores que visitaram Maria souberam que a menina-jesus, nascida na Páscoa, seria Pascolina do Espírito Santo, que virou Páscoa. Maria conheceu José, que se chamava Waldemar, que cuidou dela e sua filha. Páscoa sofreu na vida. Gerou dois anjos. Um com ela sempre viveu. O outro batera asas. Num Natal iluminado por uma lua cheia, Páscoa subiu aos céus. Chorei. Eu era o outro anjo. | |
NATAL
POR OUTRO ÂNGULO As ruas estavam vazias. Lojas e shoppings decorados com árvores de Natal e milhares de luzes coloridas que piscavam intermitentemente. O clima natalino pairava no ar. Fogos de artifícios estouravam aqui e ali. Algumas pessoas ainda passavam correndo em direção ao lar. Certamente a ceia estava sendo preparada e os familiares as esperavam para a confraternização. A casa à frente tinha uma mesa farta, repleta de refrigerantes, cervejas, panetones, rabanadas e uma infinidade de guloseimas. Crianças correndo pra lá e pra cá brincando com seus presentes que o Papai Noel trouxera. Uma música animada convidava todos a uma dança. Meia-noite. Homens, mulheres e crianças se abraçavamm e trocavam presentes, bebiam e comiam à vontade. Confraternizavam-se. A TV começava a apresentar a Missa do Galo. A paz, a comunhão, a solidariedade. O Pivete certamente não conhecia aquelas palavras assim como também não sabia de que forma saciar sua fome. E saiu sozinho pelas tristes ruas de uma alegre noite de Natal. | |
COMO
NASCEM OS CÉTICOS | |
COLAR
DE PÉROLAS Percorria shoppings com pés inchados. Urgente entrar no regime. A filha, mimada, exigia: - Dessa cor eu não quero! Outra loja, e a esperança morria: - Azul, de novo? Azul eu já tenho! Até que a garota viu o que procurava: - Este! Este! Cafuné na filha, a mãe esperou. Ele saiu pela porta dos empregados lá pelas onze da noite, vestindo a roupa vermelha. O beco estava deserto, a mulher não teve trabalho: tirou a arma da bolsa e atirou nas costas do homem. Ajoelhada ao lado do corpo, cutucou os olhos do cadáver com um canivete, tirando fora seus globos oculares. Verdes. Estava completa a coleção de olhos de Papai Noel. | |
CARTÃO
POSTAL | |
QUERO
NÃO, PRA QUÊ? | |
OBRIGADO
NOEL! | |
A
CEIA DE NATAL Raymundo Silveira João Ferreira, um nordestino, chegou em casa na noite de Natal de 1958 e sentiu um cheiro de queimado. Estranhou. Logo depois deparou com os filhos em redor de uma trempe improvisada sapecando num espeto algo que parecia pequenas serpentes. Cuidou que as crianças estivessem preparando, com cobras, uma Ceia de Natal e ficou apavorado. "Não, pai. Não são cobras. São só umas lingüicinhas que tavam saindo pelo cu e nós tamo assando pro jantar..." | |
AMIGO
SECRETO SUSTENTÁVEL | |
QUEM
BATE? Quase
meia noite. A
campainha toca. A
mãezona, dona da casa, se levanta. O marido a acompanha. Gritos das crianças,
disputando quem receberá primeiro os presentes. Silêncio. Os sinos
da Igreja da pracinha badalam meia noite em ponto. - Jesus chegou bem na hora! - diz o avô. | |
NOITE
FELIZ! Ah! Como era lindo o Natal! | |
RECONTO
DE NATAL Luzes multicoloridas vozes afinadas, cores e cheiros. Panetone. Ruas cheias, falsas alvíssaras. Acentuadas diferenças Orgia, consumo, miséria escancarada/escondida. Avareza Em Seu nome comer e beber à larga Aves abatidas, gordurosas carnes, Vinho, puro néctar. Gula Beijos de Judas,amigos secretos sorteados. Inimigos afáveis, cordialidade curta. Ira Pequenos papéis em caixa de recados - bilhetes anonimato, perjúrio, maldade. Inveja Em nome Dele falsa alegria Renascimento e luxo - poucos. Soberba. A sarjeta, os andaimes, as marquises a esconder horror da farsa/festa. Em salões requintados banham-se em caras fragrâncias. Luxúria. Em manjedoura distante Menino chora envergonhado: insensibilidade humana. Preguiça. | |
TUDO
VALERA A PENA | |