O ESCRITÓRIO
Luciene Lima
 
 

Há no beiral do computador
Estrelas de madeira
Pintadas em azul, amarelo e verde
Penduradas por um fio dourado.

O vento balança, balança elas
Essa é a forma que o escritor achou
Para trazer o céu para dentro de casa
Limpinho, colorido, harmonioso.

Na frente da mesa há uma cadeira
Que faz nhec-nhec quando alguém se senta nela
E uma almofada com capa de crochet
Dorme no colo dela.

E atrás, há um painel, diremos um céu
Com fotos de ridentes, olhos felizes
Propagandas de café e figuras de geladeiras
Nas paredes, quadros pendurados
Poemas e contos emoldurados
Uma constelação linda, inusitada.

Ao lado desse céu, perto do beiral de estrelas
Há um aparador lustroso
Que carrega uma imensidão de apetrechos
Fotos de uma sempre mesma mulher
Um batom esquecido, um frasco de perfume
Uma bolsinha dessas femininas para guardar moedinhas
E uma carta que só o escritor leu.

Aos pés do escritor, o gato dorme
Bocejando vez ou outra
Espichando-se algures.

O escritor não escreve mais
Olha, emudecido, o telefone que não toca
Enquanto a xícara com chá de enfado
Esfria sobre o piano calado.