MENINO DE CIDADE GRANDE
|
Sonia Regina Rocha Rodrigues
|
- Girafa e elefante então existem de verdade? E eu que pensava que eram bichos da terra do faz de conta... - confessou meu sobrinho, quando o levei ao zoológico pela primeira vez. A verdade é que a tecnologia sofisticada de nossas cidades massificadas está de tal forma afastando o ser humano da natureza que não é de estranhar que haja crianças que pensem que frango é um pacotinho que se compra no supermercado; pois até mesmo os desenhos infantis estão substituindo os animais por máquinas e alienígenas. Achei que seria interessante levar meu sobrinho a um local selvagem: meu sítio, encravado na zona rural, onde ainda se pode olhar o céu e ver a Via Láctea e ouvir sons absolutamente estranhos para ouvidos urbanos: grilos, cobras, pererecas e corujas. Substituir a Internet pela pescaria com certeza devolveria as cores ao seu rosto pálido. E lá fomos nós. Chegamos sábado cedinho e pelo meio da tarde dei-me conta de que esquecera de trazer sal. - Também não tem chocolate, tia. E a gente podia comprar umas lingüiças. E será que só isso de pão vai dar até segunda feira? - palpitou o garoto. Comecei a lembrar-me de que a fome desesperada de um adolescente é muito, muito maior que o apetite discreto de um senhora de meia idade. O jeito era completar a despensa com umas comprinhas de última hora. Assim, fomos até a cidade. Anoiteceu cedo, e a escuridão surpreendeu-nos no caminho. O rapazinho a meu lado estava inquieto. Sem dúvida a noite plena com seus ruídos naturais parecia-lhe ameaçadora. O farol do caro iluminava apenas alguns metros à nossa frente. - Não há perigo algum, conheço bem a estrada - tranquilizei- o. - Seu celular caiu no chão. - Não tenho celular. - Há um celular neste carro e alguma coisa está empurrando ele para o meu pé! Ante o pânico em sua voz, freei. Ele apontou-me a luz verdinha que piscava, fria, em ritmo lento, a intervalos regulares. - Tem alguém escondido nesse carro! Alguém que deixou cair o seu celular! Algum bandido! - ele quase gritava - Tia, faça alguma coisa! Eu fiz: abri a porta e libertei o vagalume. |