TIQUE-TAQUES
Hugo Carvalho
 
 

Depois que resolveram futucar meu coração pela artéria femoral, expressões tais como disfunção do nó sinusal com o nó AV normal, fibrilação atrial intermitente, bradicardia sinusal e arritmia sinusal frásica, passaram a se incorporar ao meu vocabulário. Na complexidade morfológica encontrada misturaram-se causas fisiológicas com causas adquiridas.

Longe de mim a pretensão de tentar traduzir tudo isso, mesmo porque pretensão e água benta, tomam-se nas doses desejadas. E eu, não estou agora a necessitar nem de uma, nem da outra. O que eu quero mesmo, é que minha simpática cardiologista, baiana casada com um holandês, me libere das restrições impostas e me desassuste das ameaças segundo as quais, se eu ficar marcando passo nos velhos hábitos, terei que vir a usar um marca-passo.

Mas enquanto tudo isso não chega, meus muitos charutos diários converteram-se num modesto, mas inigualável, charuto dominical.

Quanto ao álcool, não o propriamente dito, mas o outro que se disfarça sob mil nomes, foi também limitado a uma taça de vinho nas “ocasiões especiais”. Ainda bem que sou eu quem está definindo quais são tais ocasiões.

Consola-me o fato de que determinada válvula cardíaca, - bastante enferrujada, segundo a atual responsável por minhas batidas cordiais - poder vir a ser oportunamente substituída por um impulsionador mecânico dos meus tique-taques. Mas, para evitar ataques, tive que alterar meus tiques.

Haja mau humor!