MEDO
Ana Terra
 

Café em Preto e Branco

O tempo se recusa a aproveitar as férias que lhe dei. Envia-me lembranças a todo instante que me conduzem à lugares já perdidos na memória.

Entro no seu jogo. Volto à rua da minha infância. Aproveito a sombra da árvore que minha mãe plantou: uma fina haste, com dois botões verdes, que foram acolhidos pelo buraquinho que fiz na terra. Hoje suas folham enormes guardam minha melancolia.

Olho para a nossa casa. Não sei quem são os atuais moradores mas a árvore ainda me pertence.

Visito antigos vizinhos. Abraço carinhosamente corpos frágeis e envelhecidos. Sou convidada para um café. Na mesa, fotos antigas em preto e branco onde me vejo criança.

Orgulhosamente exibo meus dois fios de cabelos brancos. Ouço a velha frase: “como o tempo passa rápido!”

O dia de lembranças termina. Não quero ver o por do sol. Minha melancolia não quer ponteiros de relógio. Quero o tempo parado acompanhado por um medo manso e corajoso.

 
 
fale com a autora