A MULHER-BOMBA
Maria Luísa Rocha
 
 

A festa no clube estava animada. Pessoas sorridentes antecipavam o que iria rolar. A música estridente já conduzia alguns casais no meio do salão.

Juliana chegou suada, muito maquiada e perfumada, vestindo um folgado conjunto preto que tinha a missão de tentar ocultar os quilos excessivos. Sua companhia era tia Rita, que resolvera acompanhar a sobrinha por pura pena e com a esperança de que, desta vez, a moça encontraria um alguém, qualquer um. Afinal de contas, Juliana já passara dos trinta anos e não tivera ainda nenhum amor em sua biografia. Nem amigas ela conseguia arrumar...Parecia um complô do destino.

Sentaram-se caladas em uma mesa de canto e, imediatamente, os olhos castanhos de Juliana começaram a passear por todos os lados, desesperada e despudoradamente, numa caçada frenética. Bebeu umas três caipirinhas e logo sentiu o rosto queimar-se e as pernas bambearem. Precisou ir ao banheiro, levantou-se e quase caiu ao levar uma cotovelada no braço. Já ia lançar alguns impropérios quando, como num passe de mágica, viu-se conduzida por um rapaz alto e elegante até o meio do salão. E dançaram o resto da noite. Juliana estava bela, feliz e leve. Puro êxtase! Esquecera-se do mundo nos braços do príncipe que, finalmente, batia à sua porta. Não lhe importavam as espinhas, o mau-hálito nem a fanfarrice sem fim de Narciso. Tudo isto eram detalhes sem importância naquele monumento avermelhado e galante. Ele lhe confidenciou que adorava duas coisas: dançar e ir ao estádio ver seu time jogar. Gostava também de jogar na loteria pra, quem sabe, um dia, poder largar o emprego cansativo de motorista de táxi.

Cinco anos se passaram. Juliana e Narciso, sem planos, com dívidas e dúvidas, permaneciam juntos entre beijos e alguns tapas. De amor. Ciúmes e provocações se sucediam e Juliana ia engordando cada vez mais. Narciso conseguia manter os músculos bem desenvolvidos, o espelho devolvia sempre uma imagem quase perfeita. Aliás, nenhum espelho escapava ao seu olhar, ávido por se ver sempre em forma. Adorava-se e isto era o principal.

No carnaval decidiram ir à Bahia. Narciso queria um bronzeado, Juliana queria uma imensa burca para ocultar sua gorda brancura. Foram de avião, as mãos dadas pra espantar o medo das alturas. Lá chegando, foram passear pela praia. Música pra todo lado, alegria e samba e suor. Os blocos se sucediam, lindas mulatas a exibirem corpos perfeitos. Narciso não pôde resistir e avisou Juliana que iria dançar um pouquinho. Afinal de contas era carnaval. Juliana não disse nada e chorou. Foi até a padaria e comprou algumas barras de chocolate. Andou e andou pela praia. Comeu os chocolates com imenso prazer, saboreando cada pedacinho como se fosse o último.

A tarde chegou mansinha. O sol ia sumindo no horizonte avermelhado. Percebia-se que a maré já tinha subido. Finalmente Juliana entrou no mar raivoso, pulando as ondas quentes, sem um único olhar para trás. Estava leve como uma pluma, quase feliz, sem mais nada a temer. No último momento, quando a derradeira onda a envolveu, lembrou-se que sua cirurgia de redução do estômago estava marcada pra quarta-feira de cinzas. Logo depois do carnaval.