GERINGONÇA
Beto Muniz
 
 

Estou encantado! Devorando todas estradas que vejo pela frente!

Direção hidráulica é uma delícia mesmo. Faço as curvas usando apenas uma das mãos e o carro segue firme, quatro patas fincadas no solo rasgando tempo e distância. Após quarenta e dois anos de vida, vinte anos de carteira e carro próprio só agora deu pra pagar por esse luxo. Teve uma vez, eu era bem mais pobre que agora, que deixei escapar um bom negócio por conta de quinhentos paus. Não fechei a compra justamente porque a tal da direção hidráulica deixava o carro meia milha mais caro. Mas eu não sabia que nas curvas eu poderia assoviar, chupar cana e ainda palitar o dente. Soubesse teria fechado, não seriam quinhentos contos a mais que melaria o negócio. Na época comprei um Passat TS que quase me dá aquela doença de rico na junção dos braços, bursite? Era um volante duro demais de obedecer ao dono... coisa do passado! Agora estou podendo e dor nas juntas nunca mais.

Meu mundo caiu...

Direção hidráulica é um perigo! Vinha eu na curva todo-todo. Me achando o rei da cocada preta com outro rei na barriga. Feliz que só gente burra mesmo - como dizia a Maysa, grande Maysa, que também sofreu um acidente de carro e morreu, coitada, e tinha também uns quarenta anos na época. Foi em 1977, não foi? Mas eu vinha feliz, com apenas uma das mãos no volante (e essa foi a primeira burrice), quando o painel apagou, o motor morreu, o freio morreu, a direção morreu, a felicidade morreu, a mão morreu, tudo morreu e ficou viva só mesmo minha burrice segurando o volante travado, o pé afundado no pedal e o olho arregalado olhando para o poste. Não morri, claro, ou não estaria escrevendo que direção hidráulica é um perigo e que eu vivi muitíssimo bem, obrigado, antes de conhecer essas engenharias que não deveriam cair nas mãos de gente da periferia. Ainda bem que existe pronto-socorro para deslumbrado, mas desconfio que os pinos e chapas introduzidas nos osso da minha perna não é platina.