ALLEGRO MISANTROPO XXI
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Sérgio Galli
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Inverno
de 2006
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(Ao som de "O carnaval dos Animais, de Camille Saint-Saëns) "Tudo
o que é sólido se desmancha no ar" No reino animal, o mais animalesco dos animais o Homo sapiens. Não há animal mais cruel, mais perverso, mais estúpido, mais selvagem, mais ignorante (e por isso mesmo, o mais arrogante) do que o Homo sapiens demens. Esse primata bípede cada vez mais pretensioso está prestes a concluir sua maior obra, a destruição do planeta (ou, numa outra hipótese, se autodestruir). Nossa soberba nos impede de enxergar a nossa insignificância. Somos frutos de vários acasos. Há aproximadamente 65 milhões de anos uma catástrofe exterminou os dinossauros e, assim, os mamíferos puderam sobreviver, entre eles, os primatas, e entre estes, um raminho, o homo sapiens. Há mais ou menos dez mil anos, deixamos de ser coletores-caçadores e demos início a agricultura. A partir daí foi só destruição e devastação. Foram séculos e séculos de guerras, pilhagens, estupros, carnificinas, butins, massacres, incêndios, fogueira de vaidades, traições, brigas fratricidas, guerras civis, esquartejamentos, empalação, invasões... Nenhum outro animal conseguiu tal proeza. O auge, que deveria ter sido o alerta, foi a bomba atômica lançada sobre as cidades de Hiroshima e Nagazaki em agosto e 1945, ou seja, há 51 anos. De lá para cá, a mesma cantilena: guerras, invasões, massacres, genocídios, estupros, pilhagens... Somos o animal mais carniceiro. O animal mais rapina. O mais cruel. Nossa história, vale repetir, é banhada de sangue, suor, lágrimas e pilhas e pilhas e pilhas de cadáveres. Além disso, matamos milhares e milhares de animais para nossa alimentação. Destruímos florestas para plantar cereais. Essa voracidade nos leva célere ao abismo. O progresso nos levará ao regresso. A modernidade, ao atraso. Nunca saímos das cavernas. Antes, de pedra. Agora, alguns privilegiados, têm cavernas com um certo conforto (a que custo?): eletrodomésticos, tv a cabo, telefone portátil, automóvel - esta máquina de 500 toneladas de nos tornamos escravos, que nos domina e que destruiu as cidades, ou transformou a vida nas cidades num inferno mais infernal que o de Dante - mas que também tem o desconforto da angústia, da ansiedade, do estresse, da hipertensão, da depressão. A mais cruel das espécies criou o regime ou o sistema mais cruel: o capitalismo. Este sistema que transforma tudo em mercadoria, desde simples produtos até o corpo, a mente, a consciência, a moral, a ética, os princípios. Nos tornamos "coisa". Coisificação de tudo.Este chega ao seu extremo com o todo poder entregue a alguma centena de corporações que submetem estados, nações e povos aos seus interesses. Interesse que se resume ao lucro, o único valor a ser perseguido. Que animal é este que se trucida por causa de uma simples folha de papel (o dinheiro)? Que animal é este que quer acabar com o seu próprio hábitat, seu próprio ecossistema? Que animal é este que extermina outras espécies da fauna e da flora? Que animal é este que destrói o reino mineral, o solo, enfim, suas fontes de riqueza e de sobrevivência? Que animal é esse que contamina e polui sua fonte de vida, a água? Este é um animal racional? Não! Ao contrário, é o mais irracional dos animais! Um mundo melhor só é possível com a extinção da espécie Homo sapiens. Sugestão de leitura: "O poder do mito", de Giberto Dupas, Unesp editora; "A cultura do novo capitalismo", Richard Sennett; "Jaulas vazias - encarando o desafio dos direitos dos animais", Tom Regan, editora Lugano. Sugestão de DVD: "The corporation". |