TERNOS
Hugo Carvalho
 
 

A história se repetia todos os domingos dos anos cinqüenta do século-que-já-se-foi. Menino ainda, lá me ia eu, em direção à igreja da escola marista, onde cursava o ginásio. Missa matutina e sessão de cinema vespertina compunham os momentos da liberdade semanal pré-adolescente.

Naqueles tempos as missas eram parte integrante das atividades sociais. Às ditas comparecia, com as melhores roupas, parcela significativa da sociedade, numa disputa de vaidades e de perfumes. Os trajes dominicais masculinos, como mandava o figurino, se compunham do terno (também chamado, à época, de fatiota) em cor sóbria - azul marinho, de preferência - sapatos pretos, se fossem de verniz melhor ainda - camisa de colarinho, branca naturalmente, de pontas esticadas por duas palhetas sub e adrede colocadas, punhos duplos, fechados com abotoaduras, complementando-se com a gravata que, no meu caso, era preta, pois a par de servir para as missas, também servia para o uniforme da escola. A cor das meias variava, ora brancas, ora pretas.

A indumentária masculina dizia-se terno por ser composta de três peças: o paletó, o colete e as calças da mesma fazenda e cor. Mas não só os trajes eram completos. As missas também o eram. E enormes. Missas rezadas e cantadas em latim. O que para a turma da minha geração não se constituía em grande problema. Afinal estudávamos a língua morta durante os quatro anos ginasiais. Do "Ludus Primus" ao "Ludus Quartus".

Só que, como se dizia em latim clássico, "juventus, ventus" - a juventude é como o vento. Passou ligeirinha da silva. Mas me deixou como lembranças, além dos ternos domingueiros, as marcas indeléveis dos misteres jaculatórios daquelas missas e dos sussurros nos confessionários que ficavam ao longo dos corredores da nave. Nos ditos foram sepultados muitos de meus segredos. Dos jejuns quebrados com água, às ocasiões em que recorria à destra (quantas vezes? sempre perguntava o padre), buscando desfrutar os primeiros prazeres ejaculatórios.