SINISTRA EXPECTATIVA
Francisco Pascoal Pinto de Magalhães
 
 

olhos que os corvos irão comer. olho no olho. "não saque antes de ver o branco do olho - do branco". o índio estala os dedos da mão direita, morena. a dor nervosa incomoda o pulso tenso. nos lábios crispados, o canto de morte que não pode mais ser contido irrompe triste pelas narinas largas.

o branco transpira. recende a água-de-fogo e cavalos e ri confiante. as pernas arqueadas e as botas plantadas no solo poeirento do Novo México.

"um índio a mais, um índio a menos... bleagh!!", cospe.

no alto uma nuvem nômade se arrasta sem pressa e abranda o sol. é o sinal.

os dedos ossudos de unhas negras do caubói nem tocam o cabo da arma, já a lâmina apache rasga o espaço ligeira.

o chapéu texano de largas abas, traspassado na copa, crava no cocho onde dão de beber às montarias e o branco por um instante gargalha efusivamente; depois se enfurece, lamenta o chapéu novinho em folha, saca e faz fogo.

o índio ri. as balas dos brancos nada podem contra camisa fantasma que lhe deu o messias paiute. mesmo quando a manada de búfalos aponta na vastidão da pradaria, ele continua rindo. das sacadas, das janelas, da porta do saloon os olhos abutres em sinistra expectativa de que o corpo desabe, assistem sua derradeira dança.