BIOGRAFIA
NÃO AUTORIZADA
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Doca
Ramos Mello
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Ana Margarida nascera mesmo para ser estrela. Pelo menos, esta era a opinião de sua meticulosa mãezinha, que nunca mediu esforços no sentido de encaminhar sua menina para o doce exercício do estrelato... A bem da verdade, é preciso deixar claro que o nascimento da menina não foi uma gravidez planejada, longe disso. Pela casa dos 45, a menstruação tendo desaparecido, a gentil genitora foi ao ginecologista: "Acho que estou na menopausa". Exames pedidos, exames feitos e, semanas depois, o veredicto médico: "Sua menopausa nasce dentro de sete meses". O fato conferiu a Ana Margarida o status de temporã, trazendo no pacote muito mimo, luxos sem fim e planos mirabolantes. Daí a história do estrelato. Em família, Aninha era muito mimadinha, chatinha, queridinha, muito "inha", mas ninguém reconhecia isso, imagine, ela era uma beleza invejada, tão-somente. E era bonitinha, de fato, mas nada assim impressionante, a não ser... ...Pelo intenso aparato que a cercava, aí sim, pobrezinha, desde pequena carregada de balangandãs, vestida como uma perua em miniatura, enjoada na fala e nos gestos estudados, sempre recitando uns versinhos medonhos, os cabelos em cachos arranjados com esmero e... Pasmem, maquiagem (batom, base, blush, rímel, sombra)! As crianças achavam aquilo tudo meio divertido, criança não repara muito em certos detalhes, apesar de Ana Margarida ter enfrentado alguns preconceitos próprios da idade da inocência ("Eu não vou convidar a Aninha, ela parece um palhaço"). Foram maratonas. Desfiles, concursos variados, books para agências, aulas de canto, interpretação, violão, balé e inglês, entretanto, apesar da intensa esperança materna, Ana Margarida não emplacou na infância. Houve certa vez uma seleção para um programa infantil na tv, Aninha estava cotadíssima, mas não se classificou, segundo sua amorosa mãezinha, porque sofreu boicote: um garoto atirou gelatina em seus cabelos, o penteado desmoronou, a maquiagem cedeu com as lágrimas e os produtores avaliaram-na meio descontrolada emocionalmente, não servia. Adolescência acima, tornou-se uma mocinha simpática, bastante engraçadinha até, porém desproporcionada fisicamente e estigmatizada pelas caras e bocas inevitáveis com que encarava quaisquer eventos, de festinhas a torcida organizada. Era comum as amigas chamarem a atenção da menina porque não se podia contar com ela para nada, armada que sempre se encontrava de um estojo de maquiagem completo e um espelhinho de bolso ("Pare de se maquiar, estamos num velório!"). Nem namorados teve, os garotos não se interessavam muito por ela, gostavam mesmo era de fazer piadas com seus trejeitos ("Atenção, Ana, ventou, retoque seu batom!"). Culpa de quem? Agora, anos passados, pai, mãe, irmãos, tios e avós se atacam mutuamente, alguém tem de arcar com Ana Margarida e sua solidão permanente, coitadinha, que continua "inha", já sem grandes esperanças no estrelato, o tempo passando, a figura descolorindo e o próprio batom endurecendo na gaveta, que fazer? Oh, desânimo! Também não é assim. Por volta dos 21, parecia ter pintado a grande chance quando Ana Margarida chegou em casa e anunciou sua primeira participação em um comercial de tv. Foram dias e mais dias de trabalho, correria, alimentação rápida para não engordar, provas de cabelos e maquiagem, fotos, ensaios, uma parafernália. A família, em glória, alardeou o sucesso da moça e ainda convidou uma verdadeira multidão para assistir junto com eles ao lançamento do comercial, em casa, na televisão da sala: "Horário nobre, é mole?", jactava-se mamãe, arfante de orgulho. No dia do grande evento, 8h26m da noite, a salinha minúscula trepidante de familiares, amigos, vizinhos, conhecidos e curiosos, eis que o comercial se abre na tela. Tumulto geral! Calem a boca, abaixe esse cabeção aí na frente, cadê a Ana Margarida, dá p'ra tirar a mão do meu pescoço, ai, minha coxa, sai da frente, fecha a matraca, tira o pé de cima do meu pé, vai catar lata, cadê a Aninha, silêncio, pelo amor de Deus, não empurra, vou lhe dar uns tapas, quero guaraná, que produto é esse, quem é o bonitão, tem uma loira ali, quem foi que convidou você, CADÊ A ANA MARGARIDA?! Foi tudo muito rápido. Praticamente ninguém viu Aninha na tela, até porque, na verdade, ela não apareceu assim por inteiro, ou de ladinho, nem de costas... Mas estava no elenco, sim, e foi reconhecida exatamente por Dudu, profundo conhecedor daquela "desproporção física" da moça. Foi ele quem diagnosticou com precisão e gritou p'ra todo mundo: "Olha lá, aquele peitão é da Ana!". Mas muita gente não teve tempo de constatar porque o comercial não durou quase nada e os peitões passaram como cometas. Mãezinha ficou decepcionadíssima. |