A
INEVITÁVEL QUEDA
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João
Rodrigues
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Vejo nas amarelas folhas de um passado já remoto as vagas lembranças de um menino franzino (correndo com os cavalos), sem preocupação, feito uma folha jogada ao vento, voando, apreciando a doce e passageira liberdade que a vida oferece. Enquanto escrevo, observo, através de minha janela, a chuva caindo e deslizando vidraça abaixo; a força da gravidade. Nada evita a queda. Até mesmo a mais simples gotinha de chuva escorrega janela abaixo em direção ao solo. O vento sopra forte agora; esse mesmo vento que soprava meus cabelos quando menino; cabelos esses que não mais existem, e que são apenas lembranças que também já amarelaram, que desceram feito as gotinhas que deslizam na minha vidraça. Eles também não resistiram à força da gravidade. Nada evita a queda. Vejo as folhas dos pinheiros serem lançadas ao vento, rodopiando, sem destino. Aquele menino franzino dos tempos dourados também rodopia em minha memória. A sua idade fora lançada não para baixo, mas para frente - ano após anos. Olho na estante uma velha fotografia. Ainda retrata o sorriso da inocência. Pego carona nas asas das recordações e deslizo feito uma jangada que singra os mares empurrada suavemente pelo vento mar adentro, que se dirige rumo à imensidão do infinito oceano. Como estou diferente! Quem me dera ter ainda aquela pureza! Não que a pureza exista, não que a inocência também exista, mas a idade que ainda não conseguiu ver a diferença das coisas. Já comi meu pedaço de maçã. O pecado do conhecimento já se apossou de mim. A maçã que Newton observou cair, descobrindo assim a Lei da Gravidade. A maçã que Eva comeu, obtendo assim o conhecimento. A maçã que eu comi: descobrindo que o tempo passou - que não há mais inocência - e que também devo colocar uma folha de parreira em minhas vergonhas. A gotinha que caiu se uniu às outras e se fez um rio, correu para o mar, tornou-se ondas; depois evaporou e fez-se nuvem e caiu de novo. Nada evita a queda. O menino que se formou homem, que se formou velho, que unir-se-á à terra. Eu, o menino; eu, o homem - evaporando, sumindo pouco a pouco, perdendo os movimentos, a flexibilidade, as rugas aparecendo assim como amarelam as folhas que estão caindo. É duro compreender, mas é necessário. Tudo tem o seu fim. Meus dedos ficam imóveis sobre o teclado do meu computador. Agora leio minha memória já enferrujada pelo tempo e, em letras quase apagadas, vejo que nada escapa ao tempo. O tempo que torna o homem capaz de perceber que a vida não é nada mais do que uma simples passagem onde os homens se afogam em vaidades e se tornam escravos de sua própria ignorância - e que nada impede a inevitável queda. |