SABOR
DO CHÃO
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Zeca
São Bernardo
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Dez passos, nada mais! E André procurava lembrar-se disso sempre, a cada nova tentativa sentia que estava mais próximo de conseguir o domínio absoluto da situação mais uma vez... Afinal, que outra opção tenho? Deixar a depressão dominar-me mais uma vez e voltar para a cama? Ou para a cadeira de rodas... murmurava. Após o acidente ficar meses trancado dentro de casa, afastara-se dos amigos velhos, dos colegas de serviço, dos antigos professores e até da própria família. Achava que assim a dor diminuiria. Não queria ver que sua dor, também, era a dor deles. Mas as coisas não voltariam mais a ser como eram antes, não sob hipótese nenhuma teria a perna amputada de volta. Ou o tempo voltaria atrás e não beberia tanto aquela noite, assim evitando o acidente, o capotamento, os riscos de morte á terceiros que infligiu. Fora punido o bastante? Talvez... mas agora o fisioterapeuta entendia melhor seus antigos pacientes! Entendia-os perfeitamente bem, aqueles primeiros dez passos com a prótese apoiando o peso do corpo nos braços e nas mãos. Procurando fixar a perna que restara e ensejar algo parecido com um passo todas as sessões, todas as tardes, todos os dias, todas as semanas, todos os meses até conseguir a vitória de um passo! Sim, sorria, depois viriam outros. Três ou cinco se lembrava bem das recuperações que assistira nos últimos dez anos. E conseqüentemente estaria mais próximo de vencer a barreira simbólica dos dez primeiros passos. Olhos no caminho, enxergando além da porta enfrente. Ali, a esperança, a dor e o sabor do chão após a queda fria. Sem apoios, sem risos e lá, atrás da porta o mundo com o qual teria que aprender a viver outra vez... |